16 março 2007

Muitos comentadores e políticos estão condenados à berma da estrada

No comentário pressupõe-se que nós falemos dos outros e quando isso acontece possivelmente estamos a contribuir para denegrir a sua imagem, que como hipótese não podemos pôr de lado. Mas não será isso que nos tirará a razão dos nossos reparos em relação à acção dos outros.
Entre comentar e agir politicamente há porém uma diferença ao nível da exigência. No combate político sério devemos falar do que é a actividade dos outros, ou da falta dela, com o objectivo de mostrar que somos capazes de fazer melhor, que há outros valores que nos propomos representar.
No comentário não há esta exigência mas por outro lado há a necessidade de termos consciência que a sustentabilidade das nossas opiniões tem de resultar na própria ocasião e não num futuro que para já é uma incógnita, o comentador não se pode responsabilizar por ele.
Num e noutro caso porém há uma semelhança de efeito sobre a imagem de outrem e muitos políticos com imagem “firmada” pretendem ingloriamente que ela não seja posta em causa pela “irresponsabilidade” dos comentadores. No entanto só a nível local as pressões nesse sentido fazem algum efeito, porque a nível nacional essas atitudes são no geral contraproducentes.
Nós mudamos continuamente e, para além de nos aproximarmos mais ou menos de uma imagem verdadeira, mudamos para pior ou para melhor. Quando é para pior não há simpatia, que possamos ter pela imagem de nós mesmos, que resista a uma imagem mais verdadeira. Os outros encarregam-se de nos lembrar que já somos outros.
Quando é para melhor, quando há mais verdade na imagem para que queremos mudar, tal não é suficiente mas a ver de imediato reconhecida pelos outros. Maugrado esse esforço podemos não ser senão uma caricatura daquilo que queremos ser, já também desajustada daquilo que fomos. Este desajustamento pode dar mesmo origem à vergonha.
O sucesso de muito político passa por aqui, por escapar a estes condicionalismos do desenvolvimento social, pela rapidez com que se apresenta com a “cara lavada”, sem aparente conexão com o que no antecedente fazia criar nas pessoas uma outra imagem. As pessoas gostam de ser surpreendidas, assim como gostam de ver tombar os ídolos de ontem.
Muitos candidatos a comentadores extasiam-se ao entrar neste deita abaixo, que de tanto malharem nos “desgraçados”, algum dia algum há-de cair e eles sairão à praça triunfantes. Quando alguns caírem é a festa. Mas ao fazerem acusações avulsas, genéricas e abstractas, mesmo que acertem, não estão a fazer um comentário digno.
O comentador não pode passar ao lado do percurso dos políticos ou candidatos a tais, da sua eclosão, dos seus ocasos e renascimentos. Não tanto no sentido de andar à procura de contradições, porque mudam as circunstâncias mudam as soluções e mesmo que haja políticos visionários nem sempre essa visão é aceite pela sociedade.
O comentador deve procurar nos percursos dos políticos, que nem sempre são fáceis de analisar, porque é aí que mais se faz incidir a idolatria, aquilo que é constante, as afinidades, aquilo que permite ou não que um político vá além das suas próprias limitações, o que o torna apropriado ou não para a função, o que lhe permite ou não adoptar em cada momento as soluções mais acertadas.
O comentador deve fazer o trabalho que o idólatra gosta de fazer, porque nem tudo é negativo em toda a gente. Mas nunca pode pretender fazer o que o idólatra faz, esquecer o passado em função de que todos os aspectos positivos já estarão presentes na imagem actual e os negativos são irrelevantes.
Mas o que o comentador não pode esquecer é que ele próprio deve estar preparado com uma ou mais ideias do que deve ser apropriado fazer em cada caso, com vista a uma dada política, ao bem público. É irrelevante pedir ao comentador que tenha ou não uma só ideia precisa e concisa, como não é correcto estigmatizar aqueles que as têm.
Os actores políticos também participam neste bota abaixo/bota acima, crendo muitos que é a melhor maneira de fazer política. A nossa exigência porém cada vez mais se fixa em que eles, ao contrário dos comentadores, se virem mais para o futuro, é este que está em causa quando se escolhe alguém.
Cada político apresenta-se sempre como alternativa a alguém dentro ou fora do mesmo estilo de representação. A obsessão com o seu principal objectivo de substituir alguém fá-lo esquecer o que deve ser o seu trabalho: o estudo, a compreensão do fenómeno humano, a aquisição de sensibilidade social, o domínio básico dos condicionantes entre os quais a economia, o ambiente, a concorrência, a geoestratégia das forças regionais e mundiais.
Um político não deve ser um aventureiro. As suas soluções, sejam novas ou “recicladas”, devem ser apresentadas com a convicção de que, não tendo virtudes milagrosas, não só fará melhor, como pode contribuir para que todos façamos melhor. O político milagreiro é um fantoche.
Um bom político, sem ser lamechas, deve propor-se representar valores, como a solidariedade, que hoje ainda não suficientemente considerados nas tomadas de decisão. Aqueles que assim não procederem serão “lixo” que a história se encarregará de colocar na berma da estrada.

Sem comentários:

Aqui pode vir a falar-se de tudo. Renegam-se trivialidades, mas tudo depende da abordagem. Que se não repise o que está por de mais mastigado pelo pensamento redondo dominante. Que se abram perspectivas é o desejo. Que se sustentem pensamentos inovadores. Em Ponte de Lima, como em todo o universo humano, nada nos pode ser estranho.

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"Big Man" 1998 (1,83 de altura) - Obra de Mueck

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