31 janeiro 2010

Continua a faltar uma política europeia

Quando esta crise começou e atacou o sector bancário americano e inglês todos pensaram que íamos ser atingidos e outra coisa não poderia ser, dadas as interligações existentes com essas economias. No entanto nem todos os países se propuseram fazer mudanças imediatas, tomar medidas preventivas, preparar os remédios para a crise que se adivinhava. Particularmente a Alemanha surpreendeu por não ter tomado medidas especiais. A realidade veio provar que os alemães, quanto a si, tinham razão. Os outros que se desenrasquem.
A crise está a afectar preferencialmente os países do sul e outros do costume. Países como a Irlanda cujo desenvolvimento era recente viram-se com problemas acrescidos. Depois é a Grécia, a Itália, a Espanha, Portugal. Entretanto a Comunidade Europeia mostra uma certa insensibilidade mesmo em relação àqueles que ela ainda há pouco tinha como bons alunos. A exigência de um deficit do orçamento de Estado inferior a 3% em 4 anos é um claro exagero que não olha a fragilidades económicas.
Vamos pagar caro a pertença a este clube dos ricos, que são os que utilizam a moeda comum, o euro. Em termos de competitividade estamos agarrados ao euro, não podendo usar a moeda como factor de alteração das condições de troca com o estrangeiro. Vamos continuar a ter a possibilidade de comprar produtos que não produzimos e continuar o abandono da produção dos que podíamos produzir, mas assim não têm mercado.
A solidariedade política em termos de Comunidade Europeia está em evidente descrédito. O sector financeiro que devia ser regulado com o contributo da Comunidade permanece ao seu belo prazer. E mais do que ajudas monetárias, que se esvaem com a facilidade que se tem visto, melhor fora que a Comunidade tivesse políticas activas para redistribuir o trabalho existente, para criar uma nova divisão internacional do trabalho.

30 janeiro 2010

O comunismo da classe média lusitana

A enfermagem era há largos anos uma profissão com necessidade de pouca formação, sem grande habilitação específica. Qualquer maqueiro no serviço militar podia exercer a profissão depois de o concluir. Depois passou a haver bacharéis e a seguir licenciados. Os velhos enfermeiros fizeram cursos rápidos de actualização e foram reclassificados. Não são doutores, nem meros licenciados mas têm direito ao vencimento destes.
Várias Universidades privadas e Politécnicos públicos dedicaram-se a formar enfermeiros o que deu origem a uma abundância nunca vista. Hoje os serviços públicos já têm enfermeiros em número suficiente. Tornou-se mais difícil o desdobramento de serviço por vários locais em lugares públicos e privados. Os enfermeiros reclamam agora um vencimento maior e progressões mais rápidas com equiparações a que se julgam com direito.
Marx propôs que o tempo fosse pago de igual modo àqueles que tinham que trabalhar para viver. Isso nunca foi aplicado em lado algum, sempre ouve diferenças mesmo nos Países sujeitos a regimes comunistas. A desigualdade formal não era tanta como actualmente em Portugal, mas também não o era no regime de Salazar. As escalas de vencimentos na função pública esticaram, esticaram e não se vê maneira de este processo parar.
Enfermeiros e outras classes profissionais reclamam agora uma igualdade, não já universal, mas entre os licenciados da função pública. Já têm canudo, outros equipararam-nos, todos querem pois ganhar como outros com canudo. O que cada um faz não lhes interessa. E possivelmente haverá outros com trabalhos de menor responsabilidade e que exigem menor dedicação e que são mais bem pagos. Mas os enfermeiros limitam-se a esta velha reivindicação comunista de serem todos pagos pelo mesmo diapasão.
Tudo que seja sindicato de não licenciado não tem hoje qualquer valor. Os partidos ditos de esquerda só se preocupam e apoiam pessoas licenciadas. Para os outros reivindicam apenas o subsídio de desemprego que tanto lhes bastará. Este corte que esta esquerda está a criar é a morte dela mesma. Esta esquerda só se refere à desigualdade entre Banqueiros e trabalhadores manuais de sectores em crise. A desigualdade entre os pobres e esta classe média trabalhadora é escamoteada.

29 janeiro 2010

Mandem à Madeira gente decente

Cada barão socialista, aureolado por vinte ou trinta anos de cartão respectivo, eventualmente com mais uns anos de militância juvenil num partido esquerdista, com décadas de acento nos cadeirões do poder, quando vai à Madeira deixa-se deslumbrar com a bonita paisagem e desfaz-se em elogios a esse dinossauro que domina aquela ilha como alguém a quem é necessário pagar um tributo para não nos incomodar mais.
O João gasta na Madeira mais 300 milhões do que é gasto nos Açores em despesas correntes, não faz mal, pensam aqueles que o apoiam. De há pouco mais de dez anos já acumulou uma dívida de 1.200 milhões tanto faz. Ele agora só queria mais uns 80 milhões, mais uns retroactivos, é uma migalha no bolo geral.
O Alto Minho tem a dimensão da Madeira e não recebe nada que se parece com as verbas transferidas para esta. Que seria do Alto Minho se cá tivesse sido investido pelo Estado o mesmo dinheiro que foi lá investido? Haveria decerto mais gente dependente do orçamento de Estado, mas desde que não fossemos nós a pagar tudo estaria bem, dirão os mesmos.
Muitos dizem que a regionalização seria a solução para este tipo de questões. Na verdade não seria. Jamais conseguiríamos impor no continente regiões da dimensão da Madeira. Em cada região continental o efeito do centralismo também se iria verificar. Se o poder central não descentraliza, o regional terá um problema de afirmação a resolver e concentraria o poder numa outra base. O Alto Minho será sempre periférico.
O João move-se num mundo que o deixaram construir baseado em muito passado, algum pragmatismo, muita subserviência e pelo incremento de relações de dependência. Qual adversário que não ande precavido e se ponha a jeito é logo cilindrado pelo poder absoluto daquele régulo. Jaime Gama, Almeida Santos não têm qualquer solidariedade com quem lá luta pela liberdade, antes dão força a este energúmeno. O Partido Socialista tem que pensar em mandar à Madeira gente decente que ainda tem.

28 janeiro 2010

Há medo genuíno, mas também muita hipocrisia, muita manhosice

O medo anda por aí. Os actores políticos casa vez dão mais uma confirmação de serem realmente actores que não controlam os acontecimentos, limitam-se a acompanhar como podem e com os meios que possuem. Os próprios líderes andam parcos em declarações, já não à espera que as coisas se resolvam por si, porque sabem que isso não vai ser verdade, mas porque estão cada vez mais confusos perante o evoluir da situação.
Andamos décadas a esbanjar recursos, agarramo-nos aos fundos europeus, e agora nem temos verbas para a participação que esses fundos sempre solicitam. Quisemos ter uma moeda forte, como se o meio de pagamento resolvesse o problema da dívida e ficamos com um Estado pobre perante particulares que se foram endividando porque pensavam viver num Estado rico que tinha dinheiro para pagar todas as contas.
Quando um Estado desvalorizava a sua moeda diminuía a dívida para com os seus cidadãos, embora mantivesse a dívida externa igual. Hoje a dívida interna é tão rígida como a externa. As alterações na divisão internacional do trabalho também não nos apanharam de surpresa, antes pelo contrário, já há muitos anos se vinham a realizar e tentou-se mesmo fazer alguma coisa para nos adaptarmos a uma maior competitividade externa.
O problema agravou-se porque mesmo sectores mais avançados, com uso de tecnologia de vanguarda, foram afectados e de que maneira no caso da Qimonda. Sempre estivemos dependentes dos empresários estrangeiros, da importação de tecnologia e de capitais. Sempre tivemos um problema de escala e do nosso pouco desenvolvimento cientifico. Tivemos um problema de condicionamento industrial do salazarismo, o que também contribuiu para a fraca iniciativa nacional. Esta nasceu imediatista, à espera de lucros fáceis em curtos espaços de tempo.
Não temos um passado, como o da Alemanha, que nos dê ânimo, força de vontade, entusiasmo para enfrentar o futuro. O nosso individualismo disfarça a nossa impotência. Os economistas não têm soluções. Os políticos tentam pôr remendos num tecido já demasiado fustigado. Ninguém se atreve a fazer promessas, nem governo, nem oposição. Mas há muito manhoso a ganhar com a crise. Há muita hipocrisia nos falsos pobres de agora, nas carpideiras profissionais que proliferam na imprensa.

27 janeiro 2010

Teríamos sido enganados pela pandemia?

Já se diz com uma certa certeza que a pandemia de gripe A que se anunciava teria abortado. Há mesmo quem diga que foi um grande embuste, de que não haverá muitas dúvidas. Alguns sugerem mesmo que houve interesses que teriam influenciado a declaração pela OMS da ocorrência da pandemia. De que não haverá dúvidas é da precipitação que ocorreu. Esperemos que um dia tudo se esclareça para que não nos deixemos embarcar num fenómeno semelhante.
Ainda não lidamos bem com a pressão da comunicação social, não controlamos bem as dissemelhanças entre alerta e alarmismo, não distinguimos entre política e politiquice. O perigo, real ou eventual, levou os poderes instituídos a correr à frente de qualquer suspeita, não fosse vir a ser verdadeira a, desde o início, anunciada pandemia. E um facto, uma vez anunciado, até quem anuncia vem a perder o controle da sua enunciação. Há sempre quem empole a gravidade duma catástrofe, principalmente quando se pretendem obter dividendos políticos.
O medo, os interesses económicos, os interesses políticos criam facilmente o alarmismo quando era suficiente estarmos em alerta. Há casos em que se pode ter uma certa ligeireza, mas a saúde é um bem geral e fundamental para todas as sociedades. Os políticos não a deviam aproveitar como moeda de arremesso, os laboratórios não deviam recorrer a estratagemas que levam ao lucro fácil, infelizmente não estamos num mundo assim e temos de desconfiar de todos.
O negócio da saúde é o negócio do futuro. Ninguém quer morrer, a não ser aqueles a quem prometem 60 virgens no paraíso. Neste negócio das vacinas gastaram-se milhões sem qualquer proveito aparente. Muita gente já renunciou a ser vacinada. Os Estados já aparecem a querer despachar as compras excessivas. Ficamos sem saber se a vacina normal seria suficiente para deter a progressão desta gripe. Ficamos a acreditar menos na Ciência e pouco nos cientistas. Ficamos alarmados com o futuro deste negócio.
Teríamos sido enganados pela pandemia?
Ainda bem, mas o preço foi exorbitante.

26 janeiro 2010

Pior que a dívida pública é a dívida externa de todo o País

Com algum despudor certas figuras políticas conseguiram impor na ordem do dia o problema da dívida pública. Não que este não seja um problema gravíssimo, mas que é neste momento vivido por muitos países de finanças bem mais sólidas que as nossas. Mas pela forma ínvia com que ele foi trazido, pelas agências de rating (Standard & Poor´s, Moody´s, Fitch), o aproveitamento que hoje se pretende fazer desse facto é tudo menos honesto.
O endividamento é um problema, porém o endividamento externo é bem mais grave. É que este não é só público, o do Estado, é também um endividamento do sistema financeiro, das empresas e dos particulares a quem foram facultado meios de pagamento a que eles não deveriam ter acesso caso a Banca ponderasse convenientemente os riscos inerentes. Na sua avidez de ir buscar uns cobres à margem de intermediação desses empréstimos a Banca endividou-se de uma maneira insustentável.
É verdade que o mal foi geral, aqui como nos Estados Unidos foi para o sector da construção civil que foram canalizados a maioria desses valores. A especulação não atingiu aqui o volume que atingiu nos Estados Unidos o que permitiu que, mesmo quando os Bancos penhoram os prédios envolvidos num negócio, conseguem realizar a maioria dos créditos de que são beneficiários. Assim a Banca não está a correr os riscos que se chegaram a temer, muitas das pessoas que compraram prédios é que podem incorrer em incumprimento.
A situação pode não ser alarmante neste aspecto, o problema da dívida externa é que persiste, deixassem-nos ao menos trabalhar anos e anos para pagar esta dívida contraída. O problema virá a ser grave se a balança de transacções exteriores continuar a ser deficitária, se não conseguirmos produzir bens e serviços vendáveis no exterior e se não conseguirmos substituir algumas importações, como a energia.
Subitamente parece que toda a gente se esqueceu que é necessário ultrapassar este problema, mas de uma forma consistente, que só pode passar por uma aproximação à auto-suficiência energética, à melhoria do tecido empresarial, à melhoria das classificações profissionais, à aposta na investigação e desenvolvimento. Porém também temos que produzir aquilo que sendo barato, mas sendo importado, se torna significativo em termos de privar de emprego os nacionais.

25 janeiro 2010

O Capital em grande não conhece o dono

A União de Bancos apareceu, não a defender o negócio, mas a defender os gestores que estão à frente dos Bancos que a constituem. Já sentenciaram que se lhes forem aplicar um imposto extra sobre os seus ganhos extraordinários lá estarão para retaliar sobre o Estado e passarem a cobrar um pagamento pelos serviços que este solicitaria e pelos quais até agora se não cobravam.
Há muito se dizia que o capital não tinha pátria. Hoje poder-se-á dizer com maior propriedade que o capital não tem dono ou pelo menos não o conhece. Também se falava constantemente do grande capital. Hoje o problema não é o capitalista A ou B possuidor de um capital descomunal que o faz senhor de um país, duma região, dum sector económico. Hoje o problema é o capital em grande, o somatório de pequenos, médios e alguns grandes capitais que são geridos por uns iluminados bem pagos.
O problema é que de tanta electricidade que gastam que, de vez em quando, provocam um apagão que deixa imensa gente prejudicada, o que a estes senhores do capital em grande só provoca um incómodo passageiro a que os governos assistem logo com todos os paliativos necessários. O que levará esta gente a persistir em manifestar uma ganância desmedida e perfeitamente despropositada num País em que o desemprego é a sua principal debilidade?
O capital financeiro já tem condições especiais de tributação. Porém isso poderia ter uma justificação se esse dinheiro que o Estado não arrecada fosse usado para reforço dos capitais próprios e para a estabilização do sistema bancário. Não é moral dar essas benesses à Banca quando a carga fiscal impera sobre os outros sectores económicos. Mas não satisfeitos esses senhores provocam uma dupla imoralidade, são arrogantes e atrevidos.

24 janeiro 2010

A necessidade de reabilitar uma moral

A velha moralidade está em decomposição já há muitos anos. A hipocrisia tem permitido que uma aparência de moral vá sobrevivendo e produzindo algum efeito em espíritos mais susceptíveis. Os sentimentos que de certo modo alicerçavam essa moral foram perdendo a força e tornaram-se manipuláveis. E até aqueles que com mais veemência o não reconhecem são aqueles que já a não põe em prática na sua vida. Utilizam uma capa com que conseguem esconder este facto, mas esta é cada vez mais transparente.
Uma nova moralidade faz falta. E não há outra saída senão adquirir sentimentos novos capazes de exercer um efeito de constrangimento sobre a nossa vontade. Uma nova moralidade só será eficaz se os sentimentos em que ela se alicerçar forem inibitórios de instintos vorazes, predadores que nos animam.
Uma nova moralidade não pode permitir a hipocrisia, não pode permitir que se construam edifícios balofos, personalidades que se constroem sem qualquer correspondência com a realidade. Muitos até se acobertam sob a capa de instituições para melhor exercerem actividades que em princípio não seriam próprias de uma personalidade moralmente saudável. A moral individual deve estar para aquém da moral colectiva.
Uma moralidade não existe para nós sermos santos, patetas, contemplativos. Nós não temos que ser diferentes daquilo que a nossa natureza nos fornece. Simplesmente a moral é, em última instância, inibidora e no mínimo um alerta forte para nos abstermos de comportamentos que vão representar um malefício claro para outros. Uma moralidade tem que ser suficientemente forte para nos não deixarmos levar pela máxima de que, se os outros não cumprem, por que carga de água nós a vamos cumprir.
A verdade é que imensa gente já descrê da possibilidade de vir a existir uma moral privada e pública que possa ser assumida em uníssono pela maioria da população. Como nada se faz partindo do zero, porque é sempre necessário ter em conta um passado que todos temos, porque sobre este recai uma teimosa suspeição, temos de ter muita generosidade para simplesmente ter esperança.

23 janeiro 2010

O papel da inveja na economia

As pessoas dão pouco valor aos números dados pela economia. O que mais conta é a imagem momentânea e o que ela nos fornece em termos de expectativas em relação a um estilo de vida que pretendemos atingir. São muito poucas as pessoas satisfeitas com o seu. Na maioria das situações trata-se de jogos de perseguição em que o alvo se afasta cada vez mais à medida que nós reforçamos os esforços para o atingir.
Longe vão os tempos em que se tinha uma noção estática da vida, tudo se passava em termos de percursos delimitados, de patamares claramente definidos, de limites irremovíveis. Cada um sabia até onde podia ir e não se ruía de inveja ao olhar para o lado. Isto é, se a dita inveja lhe ascendia ao pensamento depressa a afastava porque sabia que alimentá-la só servia para piorar a sua qualidade de vida.
Hoje dizemos que a inveja tem a sua parte positiva, que sem ela nos remeteríamos a uma resignação imobilista. Hoje encontramos mesmo meios de disfarçar essa inveja sobre a capa de outros sentimentos que nunca alimentamos em estado puro. A inveja introduz-se sub-repticiamente no nosso pensamento, é ela que nos faz a vida negra. O querer ser como os outros, eventualmente o ultrapassar dos outros, pode ser um objectivo válido e honesto, mas tem que ser visto com bastante parcimónia.
A velha moralidade não produz qualquer efeito nos dias de hoje. Em termos práticos é como se todos os católicos virassem protestantes, assumissem os valores em termos economicistas mais permissivos destes. Mas mesmo os protestantes estão hoje possuídos de uma ganância nunca vista. A sociedade tem que tomar consciência de que hoje os factos são mais complexos, os sentimentos são mais compósitos, mas por este efeito sujeitos a uma subtil manipulação.

22 janeiro 2010

A econometria não nos satisfaz

A economia confunde-se quase absolutamente com a econometria. Os aspectos subjectivos, de índole psicológica, sociológica e outros são desprezados. Tudo o que não é mensurável é como se não existisse. Valores como a segurança, a sociabilidade, a convivência, o meio ambiente, a ocupação dos tempos livres, acessibilidade a serviços gratuitos e muitos outros aspectos que contribuem para o bem-estar das pessoas são ignorados.
A pobreza é um valor, ou se quisermos um nível a partir do qual se verifica uma ausência de bem-estar que a economia vai reduzindo a números seguindo o princípio de que só se deve contabilizar tudo o que é mensurável. Esta definição faz com que a pobreza vá variando no tempo porque as exigências das pessoas vão sendo em princípio crescentes e portanto, agravando-se a distribuição dos rendimentos, mais pessoas vão sendo apanhadas nas suas malhas.
Mas a realidade ainda é mais volátil do que a economia nos mostra.
Um valor anual de 5.800 Euros será a fasquia da pobreza para Portugal. Engloba a maioria dos reformados e mesmo quem recebe o ordenado mínimo porque este dá 6650 Euros, mas está sujeito a descontos e outros encargos. A fasquia da pobreza dá 483,33 Euros por mês, 16,11 por dia. O estilo de vida de umas pessoas dirá que é pouco, uma autêntica miséria, outras dirão que é bem bom, tivessem muitos ao seu dispor esse valor.
A maioria das pessoas de hoje não se comparam com o passado, nem sequer se preocupam com a miséria que existe no universo, com o facto de que para nós vivermos assim há gente que não tem acesso ao mínimo de condições que consideramos essenciais para dar dignidade à pessoa humana. E mesmo as que possam ter em conta a variação temporal e geográfica perdem-se quando vêem uma câmara de televisão à frente. Só se sabem lamentar.
As pessoas tudo vêem pelo estilo de vida que gostariam de ter. Nesta perspectiva ser pobre é não ter dinheiro para assumir esse estilo de vida e aí até eu me incluo porque há sempre um estilo que nós assumiríamos com mais boa vontade do que o que temos: Somos todos uns pobres. Não haverá econometria que nos satisfaça. Nunca nos saberemos guiar pela fasquia da balança da pobreza.

21 janeiro 2010

O que podemos esperar de Obama

Obama foi a esperança de uma nação e do mundo. A condução de um super potência, envolvida em múltiplos conflitos e chamada a intervir em praticamente todo o mundo, mas também com graves problemas internos é uma tarefa grandiosa e complexa. Uma inversão tão drástica como a proposta por Obama trouxe tantas implicações, colocou tantas forças de direita em alerta, que a sua tarefa tem sido obstaculizada ao máximo, mas também seria sempre de grande dificuldade.
Há que continuar a ter esperança. Em primeiro lugar porque a desesperança não nos leva agora a lado nenhum. Em segundo lugar porque colocar a questão num ponto de criticismo tão elevado só revelaria uma ignorância nossa, insuportável e cínica. Nestas situações é normal ser a direita a colocar as pessoas a criticar quem propôs uma politica claramente oposta á sua e esta não tem êxito imediato. Antes de haver tempo para esse êxito há que destruir logo as expectativas das pessoas, é a teoria da direita.
Obama merece ter êxito e acima de tudo merece o nosso mais franco e reforçado apoio. No entanto nos Estados Unidos é prática comum esta politica de sinais que extravasam em muito aquilo que seria sensato. Eleger um Senador republicano num Estado democrata há décadas foge em muito à nossa capacidade de entendimento. Se os americanos querem dar um sinal, para nós fazem um clarão que só reforça na nossa mente a necessidade de derrotar a direita americana, um dos grandes obstáculos à paz mundial.
De Obama esperamos que se mantenha no rumo traçado. Os percalços são normais, mas exige-se têmpera para os vender. Se nem todos os objectivos forem vencidos, restar-nos-á decerto prosseguir em próximos mandatos a defesa do seu património moral e a busca dessa paz de que, infelizmente, custa vislumbrar um começo seguro.

20 janeiro 2010

O exemplo negativo do Haiti, de tão mau, pode ser aproveitado como tal

O medo faz regredir um povo a um estado civilizacional anterior. Numa primeira fase o medo paralisa, quem sobreviveu ao drama do Haiti ficou atónito, desorientado. Seguiu-se a anarquia dos procedimentos desconexos. Numa sociedade tão desorganizada como aquela, quem pode mexe-se, procura, tenta sobreviver. A maneira como o faz não é a que nos parece mais adequada, possivelmente, se nos víssemos numa situação semelhante, tentaríamos contribuir para organizar melhor a ajuda à sobrevivência.
No entanto a nossa sociedade é muito desigual. Haveria decerto pessoas capazes de estruturar e liderar formas organizadas de responder a uma catástrofe destas. Mas haveria decerto também quem se furtasse a ser parte do lado positivo da resposta e tenderia a contribuir para participar e mesmo organizar grupos de malfeitores que espalhariam a confusão.
Outrora os laços de vizinhança eram suficientes para dar uma resposta primária a uma catástrofe deste tipo. Hoje muitos desses laços estão perdidos e nas grandes cidades nem sempre se chegaram a criar ou ficam tão só pela organização de grupos juvenis de orientação variada, mas quase sempre pouco virados para a exemplaridade da participação cívica.
As crianças e os jovens são hoje educados fora dos parâmetros do medo que eram brandidos no nosso tempo e ainda bem. No entanto tem que haver uma compensação consciente para essa forma irracional de agir. Os jovens têm que ser educados incentivando a cultura dos sentimentos de partilha, solidariedade, de todos os que ajudem à coesão social.
O medo, o desespero subsequente, são os piores conselheiros. É necessário que tenhamos na nossa mente instrumentos de organização capazes de vencer o medo. Se os não possuímos somos tentados a tentar as respostas mais imediatas, mais à mão, e não nos apercebemos que, ao agir assim, estamos a dificultar a resposta que outros queiram dar. Mas quem é que numa situação desesperada vai confiar em hipotéticas ajudas?

19 janeiro 2010

Marcelo bem se empenha, mas não é um vencedor

Marcelo ganhou estatuto. Para muitos manifestou mesmo uma real independência ao atacar desabridamente Santana Lopes quando este assumiu a direcção do partido P.S.D. e do seu governo, por Durão Barroso ter ido para Bruxelas. No entanto Marcelo sempre tomou posição, e nem outra coisa seria de esperar, e no caso de Santana Lopes essa posição tem claramente a ver com os seus interesses individuais.
A imagem de Marcelo é a que resulta de uma construção televisiva. Já ninguém lembra as suas tentativas histriónicas de se impor no panorama político. Marcelo conselheiro é a imagem que ele procurou construir e impor mesmo aos seus adversários. E de tal maneira o conseguiu que hoje Marcelo tem um grande grupo de fiéis.
Fiel é aquele que, seja o que for que o mentor espiritual diga, acredita sempre. Na sua incapacidade de seguir criticamente a vida política portuguesa o fiel de Marcelo espera ansiosamente pelas noites de domingos para actualizar o seu cardápio de argumentos que vai utilizar nas suas conversas com os amigos e adversários. Neste sentido Marcelo faz falta, porque a sua ausência corresponderá a uma desorientação total desses seus fiéis.
Mas não se acredite que Marcelo consegue ganhar novos adeptos. O seu universo de fiéis já está preenchido há muito. Muitos políticos, do P.S.D. e não só, acreditarão que será melhor lidar com um rebanho ordeiro do que com uma manada tresmalhada. Porém também há muitos políticos que acham que a sua posição privilegiada é utilizada no reforço da sua posição politica interna e externa sem haver possibilidade de contraditório.
A RTP foi à pressa buscar este mistificador quando ele foi escorraçado da TVI. O seu espaço foi contrabalançado com o espaço entregue a António Vitorino, pessoa muito capaz mas cujo riso cínico revela uma vontade de permanecer na penumbra do P.S. sem se empenhar, sem se comprometer, a não ser contribuir com a feitura de uns programas do partido que ninguém vê e muito menos segue.
Entretanto Vitorino vai acumulando capital económico e político à espera que o P.S. venha a ter os problemas que o P.S.D. hoje tem. Vitorino parece desistir agora, Marcelo não esquece o seu sonho de ser mais do que uma rapaz truculento criado nos meandros do antigo regime, mas que achou vocação para ser democrata tardio. O facto de haver quem o ouça não quer dizer que haja quem nele se reconheça. Bem se empenha, mas não é vencedor.

18 janeiro 2010

O congresso do P.S.D. verá renascer Santana Lopes?

O P.S.D. é um partido que se não sente bem fora do poder. E, como ressalta à vista de todos, com a forma directa de eleger o líder acentua-se a formação de grupos e a expressão pública e permanente das suas divergências. O carácter federador dos grandes partidos não se coaduna bem com a ausência da discussão interna de ideias e projectos.
A discussão que é feita na praça pública pode dar para determinar qual a pessoa que melhor passa, mas não permite que se coloquem questões importantes para o partido, que muitas vezes não são as que estão na agenda mediática. Para este efeito cada partido terá que criar uma agenda própria. A discussão virada para o público tende a desviar-se para questões que salientam as diferenças e desvalorizam as convergências.
Numa discussão interna os membros do partido são levados a valorizar os esforços de compatibilização, convergência e mesmo assimilação, que naquela discussão virada para o exterior são relegados para mais tarde e depois podem vir a não ocorrer. O congresso que é convocado para empossar o líder é destinado à apoteose e não àquele tipo de esforços. Serve para esconder as diferenças, não para as minimizar.
Discutidas ideias e projectos há uma melhor escolha do líder. Em certos momentos é realmente mais fácil começar pelo fim. Mas essa facilidade pagar-se-á cara mais tarde. Por isso poder-se-á discutir o tempo em que um congresso deve ser feito, a sua conveniência em determinado momento, mas é lá e não na praça pública que os conflitos internos, porque é disso que verdadeiramente se trata no P.S.D., podem ser dirimidos.
Como partido de poder, no poder as divergências diluem-se. Santana Lopes foi o único que teve uma forte contestação no poder. Precipitou-se e trocaram-lhe os passos, estatelou-se, caiu. Houve forças suficientes para alterarem o passo ao P.S.D., para não o deixarem assumir plenamente o ritmo que Santana Lopes tinha para lhe imprimir. Faltou-lhe o congresso federador. Ainda irá a tempo?

17 janeiro 2010

O Haiti é o exemplo mais evidente da necessidade de organização

A tragédia do Haiti, de tão dramática, sem paralelo noutras tragédias do género, chama a então para a desigualdade extrema existente na humanidade. A miséria não é endémica, os irmãos do habitantes do Haiti que conseguiram lugar no vizinho do Norte são pessoas de sucesso, a começar pelo desporto em que têm apresentado resultados surpreendentes.
Na divisão internacional do trabalho não coube a este povo qualquer naco substancial. Qual seria a razão pela qual o capital americano se não direccionou para este país? A ditadura já acabou há anos naquele país. Afinal a miséria actual é apenas a continuação de um processo de que o mundo há muito se alheou.
Este drama chama a atenção para a necessidade de um país ter uma estrutura produtiva própria, mas também para a necessidade de uma organização estatal sólida, que possa resistir à instabilidade política e também a esta instabilidade natural a que por uma razão ou outra todos estamos sujeitos.
Na ausência de autoridade é problemática a distribuição de alimentos, os socorros imediatos. Mas a face mais terrível ainda estará para vir se os grupos marginais tomarem conta do espaço público e se a recolha dos mortos se mantiver inoperante.
O Haiti tem que ser ajudado maciçamente e tudo indica que o vai ser. Porém não pode continuar a ter os mesmos problemas no futuro. Não pode existir aqui uma questão de regime político. Tem que haver uma estrutura que consiga resistir a todos os abalos futuros. Essa estrutura, contrariamente ao que pensa a direita radical, não necessita de ser muito agressiva, precisa é de ser resistente e economicamente suportada.

16 janeiro 2010

A concorrência é a mãe da corrupção, mas por isso não se vai acabar com ela

Os neo-liberais portugueses só retém, da ideologia que dizem defender, o seu impacto nas relações laborais. Para eles os patrões têm direito de se descartarem dos empregados em qualquer justificação, isto é, a propósito de tudo, de qualquer indisposição na economia e até no seu humor. No que se refere ás implicações na concorrência dispensam-nas, desta não gostam.
A regra básica de uma economia de mercado é a livre concorrência, só através desta se consegue a máxima eficiência e se garantem os preços mínimos para os produtos, bens e serviços que são colocados à disposição das pessoas. Mas os nossos neo-liberais gostam de recorrer ao conluio directo com o Estado e em último caso não dispensam a corrupção, afinal ela pode fazer parte do jogo livre porque qualquer um pode recorrer a ela.
A corrupção aumenta o custo de produção de todos os bens e como tal é um entrave ao desenvolvimento económico. Se o valor pago na corrupção não poder ser transferido para os bens que a empresa produz então pode estar a suportar um custo que não lhe vai permitir investir em desenvolvimento e em última instancia a vai colocar em desvantagem no futuro. Daí os nossos neo-liberais preferirem o conluio com o Estado e até chegarem a investir forte em o aprisionar.
Não temos neo-liberais assumidos na política, muito menos depois do despoletar desta crise. Eles tentam influenciar os partidos e utilizam-nos na sua estratégia. A aposta forte inicial foi no P.S.D. mas nem sempre este correspondeu às suas expectativas. Afinal este está cheio de parasitas que se sentem melhor pendurados no aparelho de Estado do que a correr riscos desnecessários. Podem ser contra a corrupção, mas também são contra a concorrência.
Onde a concorrência é mais distorcida é nas relações com o Estado. Aquele que devia ser árbitro nas relações entre particulares dificilmente o pode ser nas suas próprias relações com os mesmos. Qualquer injustiça que o Estado cometa, qualquer atentado à livre concorrência dificilmente será corrigida/o. Por isso essa tentativa de apropriação que os grandes grupos económicos fazem do Estado. Se a concorrência é a mãe de toda a corrupção, a verdade é que esta consegue aprisionar a sua mãe.

15 janeiro 2010

O que está em causa no Haiti é toda a civilização ocidental

Não tinham nada senão a vida. Já não tinham terra que desse alimento para o seu sustento. Já não tinham floresta que desse combustível para cozinharem o pouco que conseguiam angariar. Já não tinham organização de Estado ou qualquer outra que o substituísse. Só tinham tido uma ditadura de décadas que aniquilou todas as linhas possíveis de desenvolvimento deste País a que se seguiu um regime sem força e inoperante.
O Haiti está agora à espera do apoio maciço de todo o mundo para ocorrer ao desastre que foi o terramoto do dia 12 passado. Pode ser a sorte para os que sobreviverem, depois da catástrofe para centenas de milhar de pessoas. Será uma sorte paga com muito sangue, mas não pode ser de outra forma. O mundo não pode abandonar outra vez aquele povo cuja capacidade de organização se vê quando o seu Presidente, por não ter onde dormir, vai para o estrangeiro e deixa o seu povo desamparado.
A ONU já se encontrava no Haiti para dar um pouco de consistência a um Estado totalmente desorganizado. Mas faltava-lhe tudo, a começar talvez pela auto-estima da gente do Haiti. Este País, maioritariamente constituído por indivíduos de raça negra, foi durante muitos anos um entreposto de escravos oriundos de Africa e cujo destino era os Estados Unidos.
No fundo quem lá ficou é porque não foi vendido como escravo e nos anos mais recentes não conseguiu emigrar para o grande vizinho do Norte. Retiraram-se milhões do seu ambiente natural em África para ficarem ancorados numa ilha perdida das Antilhas sem condições, sem meios, sem apoios. O desastre do Haiti já começou há muitos anos.
O Haiti, antes do terramoto, já estava no limite mínimo quanto às condições que oferecia aos seus habitantes. Hoje está abaixo de qualquer patamar de que se anteveja um saída desta catástrofe em termos minimamente satisfatórios e dignos no quadro da condição humana. O que está em causa no Haiti é toda uma civilização que, para ter o sucesso que teve noutras áreas, criou estas terríveis e inumanas reservas.

14 janeiro 2010

Não corre o B.E. o risco de se tornar um partido parasitário?

No nosso País criou-se o hábito de pedir tudo ao Estado. Não que no tempo de Salazar ele desse alguma coisa. Quando muito permitia que a Caritas nos desse leite em pó e queijo amarelo da Holanda e alguns trapos vindos da América, mas que, de tão bons para a época, raramente chegavam ao seu destino. Afinal éramos quase todos pobres, mesmo aqueles que se faziam de ricos e que ficavam com esses farrapos.
O hábito de pedir ao Estado ter-se-ia então criado por protesto, porque nós, com a falta de consciência colectiva, atribuímos esse papel ao Estado. Também lhe atribuímos um papel repressor. Mas como ele nunca nos tinha dado nada, agora é a hora de nos dar alguma coisa. Afinal se agora o Estado não reprime é porque não quer, mas que vá dando na mesma, que todos continuamos a precisar mesmo que alguns já sejam imensamente ricos.
É isso que o B.E. descobriu e quer tirar a uns para dar aos outros, na aparente certeza que, criando esse sistema de vasos comunicantes, o problema fica resolvido. Honra seja que nunca o P.C. nos áureos dias de Abril propôs resolver o problema dessa maneira e sempre disso que havia que trabalhar muito, não fosse o poder cair-lhe na mão e não ter nada para dar. É verdade que recentemente cedeu um pouco à demagogia que consiste em “os ricos que paguem a crise”.
No entanto hoje é o B.E. o lanterna dessa ideia, nada tendo a propor de concreto para resolver os problemas nacionais, antes apresentando despesas e mais despesas, na tentativa de justificar a negação de todo e qualquer orçamento. O P.C. tem sido mais comedido e pelo menos demonstra uma preocupação com a viabilidade da segurança social que só lhe fica bem. Por este andar o B.E. corre o risco de ficar sozinho, tal partido parasitário e pelintra que só pode reivindicar os caídos.
Terminadas as causas fracturantes, mais um caso que depois de resolvido parece não ter a relevância que se lhe dava, ao B.E. resta-lhe procurar novas propostas construtivas sob pena de se esvaziar de conteúdo. É necessário ter uma política de trabalho activo, de organização económica e social para obter credibilidade política. O P.C. ainda tem, porém, a querer correr atrás do Bloco, também ainda a perde.

13 janeiro 2010

É agora que lhes vamos partir a espinha?

Sem que o Partido Comunista para isso tenha contribuído, mas mais por efeito dos erros próprios da alta finança, o certo é que se criou a sensação, mesmo dentro do sector, que a sua espinha dorsal estava seriamente afectada e debilitada. Muitos rejubilaram: É agora que a vamos partir, afirmaram mesmo alguns.
Passado pouco mais de um ano desde o início da borrasca, eis que surgem financeiros a ostentar a antiga arrogância, a afirmarem bem alto que são eles os donos do principal instrumento que pode dinamizar a economia, que têm influência cá e lá fora, que podem tramar o País, e ainda por cima que todos tem de olhar para eles como o exemplo máximo de honestidade.
Afirmam que ninguém se pode imiscuir nas suas questões internas, como vencimentos e procedimentos que envolvem riscos. Nunca se preocuparam em alertar para os perigos em que muitos deles se envolveram, e que deram origem ao roubo de milhões de pessoas, mas agora são alarmistas quando aos perigos que o País pode correr se se endividar mais. Pretendem dar a ideia que são eles os únicos que têm uma palavra a dizer para que não nos caia em cima a espada do capital.
O capital sempre tentou controlar Reis e Presidentes, sempre dispôs de um poder imenso. Isso incomodou homens de direita e esquerda, alguns tomaram medidas radicais, mas na verdade o capital tem a virtuosidade de se recriar continuamente. Hoje já há homens que sem dinheiro, mas por via da profissionalização, se alcandoram a gestores de topo de grandes grupos financeiros. No geral são mais avarentos e gananciosos que os velhos capitalistas.
Lidar com os homens do dinheiro não é tarefa fácil. Partir-lhes a espinha é improvável. A tarefa dos políticos é conciliar o interesse particular desta gente com o interesse geral do País. No entanto eles não têm qualquer tipo de superioridade sobre os outros, antes pelo contrário. Por gerirem um objecto tão volúvel e até execrável como é o dinheiro correm especiais perigos de baixeza. Mas só se lhes exige uma qualidade: A honestidade.

12 janeiro 2010

Se casas não adoptas, parece ser um exagero

Há um grande descuido no uso de linguagem. A riqueza da língua portuguesa reside, diz-se, em que tem muitos termos para significar quase o mesmo. Mas só quase. Normalmente há um termo que se aplicará com mais precisão. A regra deve ser que a linguagem deve ser usada para nos exprimirmos de modo expressivo. E dá possibilidades para dizermos o que queremos sem necessidade de recurso a explicações suplementares, muito menos a interpretações autênticas.
Ao falar temos a pretensão de dizer logo tudo. Partimos do princípio de que o outro tem capacidade de o entender. Há muito iliteracia, mas isso só tem emenda por recurso à leitura atenta e perscrutadora. Falar raso, pelo menor denominador comum, também não é a melhor solução. Desde logo porque retira conotação ao discurso que se segue. De certo modo ao falarmos escolhemos aonde nos queremos encontrar com as pessoas, todas e quaisquer, e não aquelas que eventualmente queremos que nos ouçam.
Falar raso pode ser muito claro, mas é decerto muito pouco. Se a língua nos permite ser mais explícitos, mais expressivos, devemo-lo ser. Não devemos entender isso como um capricho. Por isso eu propus que se procurasse um termo que designasse desde logo o casamento homossexual. E, tendo-se adoptado a linguagem rasa, não se entende não haver adopção.
À união de dois seres, seja de que natureza for, mas que envolva sexo, chama-se casamento, desde que registada na conservatória respectiva. Há muito se deixou de exigir que a adopção fosse feita por casal com marido e mulher, embora se reconheça que essa seria o melhor ambiente em que uma criança poderia ser criada. Mas as contingências da vida nem sempre permitem que assim seja, pelo que, para a adopção, não é relevante o sexo praticado por um casal devidamente registado.
Quaisquer parceiros dum casamento devem ter o direito de se candidatarem, isolada ou solidariamente, à adopção. A adopção em si será um problema para quem for responsável por escrutinar entre os candidatos quem melhores condições forneça. Por mais interpretações autênticas que se dê ao casamento homossexual não há barreiras que possam resistir ao direito a ser considerado candidato à adopção. O problema linguístico subsistirá sempre. Com esta interpretação que vingou não será fácil permanecer esta discriminação.

11 janeiro 2010

Sem trabalho não há cultura que resista, mas esta faz falta

Até uns tempos atrás a direita espalhava uma ideia, e a gente néscia seguia-lhe a linha de pensamento, porque sempre era mais fácil os outros pensarem por eles do que cada qual pensar por si próprio. Dizia-se que não faltava trabalho, antes havia preguiça e faltava vontade de trabalhar. Situações destas haverá ainda, mas nunca foram genéricas, muito menos agora.
Paulo Portas procura ainda suster esta maneira de ver as coisas. Ataca o Rendimento Social de Inserção e atribui-lhe todas as culpas, a quase única responsabilidade pelo desleixo e indolência da população em geral. Retirar umas dezenas de milhar de pessoas do RSI resolveria, na sua ideia, todos os problemas, aumentaria em todos a vontade de procurar trabalho e de trabalhar e disponibilizaria milhões para as pensões. É redutor, se não fosse ridículo.
Felizmente que a maioria das pessoas se apercebe a determinada altura da sua vida que necessita de trabalhar. No entanto não haverá dúvida que hoje a cultura do trabalho tem pouco espaço no ensino, muitas vezes nem se percebe para que é que o ensino está dirigido, porque por mais méritos que a cultura geral tenha, há uma necessidade básica anterior a suprir. Os responsáveis pensam que as pessoas aprendem só por verem os outros a trabalhar.
Passa muito mais pela escola do que por qualquer outro local a difusão de uma cultura de trabalho. O que sobre isso diz um qualquer político não é levado a sério e o efeito Salazar com a sua cultura de direita está a diluir-se e ainda bem. Vê-se como as minorias que desprezam a escola, que difundem na sua comunidade culturas próprias avessas ao trabalho, são aquelas que têm mais dificuldade na integração no mercado de trabalho.
O problema é que, depois da difusão da cultura de trabalho, é necessário disponibilizar trabalho às pessoas, porque deve ser através deste seu contributo para a comunidade que devem ser distribuídos os rendimentos necessários para a subsistência e aquelas outras benesses que a civilização nos vai podendo proporcionar. É a consciência que alguns adquirem que assim não é que os leva à malandrice e à criminalidade.
Longe vão os tempos em que os antepassados de Paulo Portas gritavam que não havia quem quisesse trabalhar. Eles imponham um preço inaceitável. Hoje esses mesmos desistem de apelar ao trabalho nessas condições. Embora alguns insistam, com vencimentos tão elevados na estrutura superior do Estado, da economia, das finanças, só pode ser querer humilhar os outros quem queira que se trabalhe por uma malga de arroz, como eventualmente acontecerá na China.

10 janeiro 2010

Não necessitamos de ricos, mas de pessoas com iniciativa e inovadoras

Em tempos dizia-se que sem ricos não havia trabalho, muito menos emprego. Até há setenta anos atrás a indústria nacional proporcionava pouco emprego. Até ao fim dos anos cinquenta manteve-se incipiente e tal se deveu muito ao condicionamento industrial, ao controle que Salazar fazia da expansão dessa perigosa actividade, antro de comunistas e outros contestatários.
A maioria da população trabalhava então na agricultura. Com dificuldade conseguia sobreviver, o que deu origem a uma situação insuportável que o Bispo do Porto denunciou, referindo os fundilhos na roupa e as alpercatas nos pés dos trabalhadores, fizesse sol ou chuva. Era um País miserável.
Os pequenos artífices viam-se dependentes dos rendimentos dos outros trabalhadores, de que se destacavam os tão miseráveis agricultores. Ricos havia muito poucos. Nesse tempo os funcionários públicos tinham a sua principal vantagem em receber ordenados fixos, contrariamente ao resto da população dependente de tudo, a começar pelas condições naturais.
Muitos artífices limitavam-se a pequenas reparações, que trabalhos de alguma envergadura eram muito poucos. Pedreiros, carpinteiros, serralheiros, sapateiros, alfaiates, quase todos se limitavam a pôr remendos no pouco que já existia. Alguns agrários eram ainda mais sovinas que aqueles que tinham algum rendimento. Dar trabalho para eles só em última instância e se não conseguissem quem o fizesse por uma malga de caldo.
O comércio dependia de algum fundo de maneio que as pessoas conseguissem e da permissão de exercer a actividade, que na maioria estava sujeita a alvará. Entre os comerciantes encontravam-se alguns dos ricos, mas na verdade na altura não eram em muito quantidade. E raramente eram inovadores porque se limitavam a reinvestir na … agricultura. Era um círculo vicioso que perdurou durante décadas.
Na verdade parece que mantivemos esse velho hábito de querer manter uma actividade eternamente e, sacar rendimentos dela, sem reinvestir na sua melhoria ou na sua reconversão. Todos querem viver à grande e à francesa, sem pensar no futuro. Só que com esta crise o investimento directo tornou-se de novo difícil, mesmo havendo vontade. Há um bloqueamento na economia que lembra esses tempos antigos.

09 janeiro 2010

Não se combate o desemprego com a velha noção de emprego

Há nos dias de hoje na imprensa um certo receio de não ter “razão”. Coloca-se todos os dias a jornalistas e comentadores o problema da linguagem e do ardil que o seu uso indevido pode constituir. Quase todos partem do princípio de que não podem ser acusados de tendenciosos e portanto terão “razão” ao colocarem-se ao lado do pensamento único que assola a imprensa e nivela todos os discursos.
Da forma como muitos assuntos são abordados na comunicação social, com diferenças tão ténues entre a maioria dos participantes, ficamos sem saber porque razões tais intervenientes se colocam em campos opostos. Ficamos com a ideia de que cada qual só se preocupa em provar que sabe manipular melhor a linguagem. Todos são capazes de o fazer a um nível de exigência muito semelhante.
Porém como é evidente as palavras não têm a mesma conotação quando utilizadas por pessoas de campos diferentes. A direita e a esquerda historicamente sempre valorizaram de maneira divergente certos temas que na actualidade parecem convergir. O desemprego sempre foi apresentado pela esquerda com uma calamidade social a banir e pela direita como tema a desvalorizar, apresentando-o como simples fundo de maneio do seu sistema de economia liberal.
A esquerda fez do emprego uma bandeira. A direita fez da camuflagem do desemprego uma exigência. As diferenças atenuaram-se sobremaneira. Hoje o desemprego é um grande hiato utilizado pela direita e pela esquerda da mesma forma alarmista. Se for para levar a sério, se for para manter esta preocupação, esta linguagem ganhará nova conotação, passará a ser usada como pensamento único em qualquer circunstância.
Ainda bem que a direita não mais poderá desvalorizar o desemprego. Todos teremos que o combater de modo permanente. Para isso a direita tem que abandonar a ideia de que dar emprego é uma benesse de rico para com o pobre, ou um direito que o pobre cobra ao rico. O emprego já não vai por aí. Dar emprego é antes uma obrigação da sociedade.
Nem sempre poderemos escolher o emprego. Mas também será bom que não fiquemos agarrados a ele toda a vida. Mesmo com pouco emprego o homem não esquece que a sua luta de libertação da grilheta do trabalho vai continuar. Qualquer dependência terá que ser temporária e funcional. O tempo de trabalho a qualquer preço acabou.

08 janeiro 2010

É irrecusável o apoio aos desempregados

O grande drama dos dias de hoje é o desemprego. Quase eliminada a economia de subsistência, deslocados para os subúrbios das grandes urbes, os desempregados de hoje não têm um caminho de retorno a percorrer. Os desempregados de hoje ficam dependentes da segurança social e do Estado que têm que contribuir para a sua reinserção profissional e para a sua subsistência imediata.
Cada qual terá uma forma própria de reagir ao desemprego, mas para muitos é uma fonte de angústia, um motivo que despoleta um sentimento de deslocamento, de desfasamento em relação àqueles que obtêm tão facilmente emprego e podem beneficiar mesmo de uma mobilidade profissional que só será do domínio do sonho para muitos dos actuais desempregados.
O ideal seria o pleno emprego, mas as sociedades que o patrocinavam também falharam rotundamente. Hoje o pensamento único é o do neo-liberalismo económico que, à semelhante do velho, continua a defender a existência de uma reserva de mão de obra capaz de fazer baixar os salários e permitir um fácil recrutamento em momentos de picos de desenvolvimento e o despedimento em alturas de crise.
A discussão entre o falso emprego, mantido só para tapar as aparências, e a existência de subsídios compensadores passa muito pela questão de quem vai pagar a conta final: Se as empresas, se o Estado. As empresas deveriam compensar quem para elas contribui, mas muitas delas vivem também no limite da subsistência. Claro que há outras cujo rendimento daria para manter um certo emprego à espera de melhores tempos, mas a verdade é que até os japoneses já abandonaram tal prática. Preferem capitalizar.
Provavelmente o desemprego é uma realidade com que temos de aprender a viver, já não a falta de emprego dos tempos de Salazar, mas sim aquele que ocorre quando as pessoas já estão absolutamente desenraizadas, inseridas em ambientes hostis, dependentes no meio da selva social. Mas o desemprego tem que ser visto não como um custo social, mas como uma situação de direito a um apoio irrecusável.

07 janeiro 2010

Não se afasta um político de boa estirpe de maneira insidiosa

O falhanço dos líderes que lhe sucederam provou que Santana Lopes era o líder natural do P.S.D. Só que quando chegou o seu momento de ascender ao poder caíram em cima de si todos os pesos pesados do seu próprio partido, a começar por Cavaco Silva, Ferreira Leite, Marques Mendes e outros adeptos da verdade, mas a quem falta uma série de qualidades a começar pela lealdade.
Santana Lopes e José Sócrates foram os homens que tornaram a televisão um espaço de discussão da política, do que beneficiaram todos, mas que foi aproveitado por alguns demagogos para levar a política para o achincalhamento, a ofensa pessoal, a lavagem de roupa suja. Porém o facto da imprensa em geral ser deficitária levou a que cada vez mais esta fosse mais manipulada no sentido de dar rendimento doutro tipo.
Hoje o que tem mais sucesso na televisão são as caricaturas. Não se fala das pessoas tais quais elas foram nas suas circunstâncias e são perante tantas adversidades. Fala-se daqueles que para Cavaco são os seus inimigos, daqueles que Ferreira Leite gostava que não existissem, fala-se daquilo que eles são para esses outros, mas não deles mesmos.
A imprensa tem dessas coisas. A imprensa entende que não existe para glorificar figuras e o pecado capital destes dois protagonistas principais dos últimos anos da nossa política é o de terem centralizado em demasia o mundo neles mesmo. Simplesmente são eles que personificam hoje as qualidades e as virtualidades do P.S. e do P.S.D. Não quer dizer que não hajam outros valores, mas não despontam suficientemente e para já são estes que ainda encarnam o que há de mais genuíno nos respectivos partidos.
Não falta quem veja a morte política de qualquer um deles no dia seguinte. Temos imensa gente insignificante a, na sua ânsia de poder, mesmo que fictício, os veja definitivamente arrumados à primeira dificuldade. Porém não só Sócrates, mas também Santana, aí estarão a dar a sua colaboração para a decisão sobre o nosso futuro.

06 janeiro 2010

O terreno da luta continua favorável a Sócrates

Há quem tenha criado para si um perfil adequado a cada cargo específico. Procedem assim os burocratas mas também todos aqueles que, não o sendo, gostariam de o ser. Tal papel inclui quantidade de riso, postura física, roupagem, expressões linguisticas e faciais, um sem número de características que farão de um homem vulgar um bom candidato a qualquer coisa. Felizmente que após o 25 de Abril nenhum perfil forte foi imposto para os cargos públicos.
Tivemos já todos os altos cargos ocupados por pessoas de características bem diversas e ainda bem. Se alguma coisa resta do antigamente, Sócrates não corresponde a esses cânones que muita gente ainda louva. Haverá o perigo de triunfar o que está na moda e sabe-se como a moda muda. Quem tiver a sorte de se identificar com a moda no momento certo verá a sua vida facilitada.
Sócrates surgiu entre desistências e afastamentos duvidosos, no momento certo em que era mais valorizada a facilidade com que enfrenta o confronto mediático. Para o bem e para o mal, quem vence é quem passa na televisão. E efectivamente não haverá meio em que as coisas se podem tornar tão absolutamente claras. Não fossem os jornalistas teleguiados por interesses que lhes são superiores e teriam outro discernimento para chegar mais longe do que o que vão.
Coube a Sócrates suceder a Santana e não o contrário. O desastre prático de Santana deixou o terreno livre a Sócrates, o que permitiu que este cavalgasse à vontade. O seu principal adversário estava K.O. antes do verdadeiro início do combate de Sócrates. Ninguém duvidará que tudo seria diferente se Santana se não tivesse estatelado previamente, porque tudo estava preparado para um combate mais igual.
Os outros adversários de Sócrates tentam levar a luta para outros terrenos, recorrem à insidia e à agressão moral, vão derrotados para o terreno à espera da benevolência da população, enfim cheia de que o mesmo actor ocupa permanentemente o palco. É uma luta de tudo ou nada, que não difere muito do que se passa no interior dos partidos. Por isso os aparelhos partidários às vezes pouco apoiam e mais estorvam. E cada líder está cada vez mais só e tem de olhar bem para a sua frente e para trás de si.
Ninguém duvide que é na televisão que decorrem as jogadas decisivas e quem quiser entrar no combate tem que se preparar para isso.

05 janeiro 2010

Sócrates merece a nossa absoluta solidariedade

Todos os partidos são influenciados pelo seu líder. Qualidades e méritos de um líder beneficiam e prejudicam, confundem e esclarecem e nem sempre no sentido que se acha previsível. Isto é, a leitura pessoal e a leitura política nem sempre coincidem. É pois bom que essas leituras não sejam feitas ao mesmo nível, ou seja, que não se exija que todas as qualidades e méritos se encontrem ao mesmo nível.
Se em Guterres eram reconhecidos méritos pessoais, já a sua maneira conciliatória de fazer política e o seu abandono intempestivo, à primeira dificuldade, da liderança socialista só pode ter uma leitura que a encaminhe para o desastre. Se uma leitura pessoal daria uma opinião favorável, uma séria leitura política dará uma opinião desfavorável, pelo prejuízo que adveio para o partido, para o País da sua atitude. Não há pois que confundir, nem abafar defeitos com qualidades e deméritos com méritos.
É vulgar confundir o mérito político com o mérito de um percurso de vida. Desde Salazar que se enaltecem catedráticos e outros dignitários porque, no geral, só lá chegavam os poderosos. Quem o não era e lá chegava também era aceite no sentido de também haver uma certa renovação no pessoal político. Mas um percurso pouco ortodoxo era logo motivo de suspeição à menor dificuldade. Só se salvava o próprio Salazar.
Também Sócrates é vítima das dificuldades familiares, da origem provinciana, do percurso académico segmentado, de tudo aquilo que o torna diferente dum Santana Lopes ou outro lisboeta de gema. Não se podem ver as suas dificuldades pessoais como méritos políticos, mas também ver o contrário é mesquinho e indevido. Porém a isso se junta um rasto de sujidade com que se pretende conspurcar e afectar as suas qualidades pessoais e em especial as políticas.
Sócrates a tudo tem resistido. E, se terá descurado o pôr em evidência as suas qualidade pessoais, tem-se defendido bem politicamente. Porém os seus inimigos são poderosos e à falta de argumentos políticos continuam a brandir insinuações pessoais imperdoáveis. Dar a Sócrates a nossa solidariedade perante as dificuldades que se lhe deparam é o mínimo que se nos exige.

04 janeiro 2010

Cavaco aguarda uma vaga de fundo

Lapso, impreparação, indiferença, falta de dedicação, o certo é que Cavaco é internacionalmente um zero. Mesmo internamente quem anda na ribalta há trinta anos não construiu qualquer imagem apelativa. A não ser um vago apego a valores tradicionais, não se lhe conhece espinha dorsal própria, deixa a ideologia para outros mais capazes.
As suas intervenções a nível da Comunidade Europeia foram de uma fraqueza confrangedora, decerto que não a nível técnico, mas em relação ao entusiasmo transmitido, ao espírito participativo, à adesão humana a um processo que é feito por homens e para homens, ao calor que é necessário emprestar para que tudo se desenrole num ambiente favorável.
Muitas vezes atribui-se uma superioridade a pessoas que vivem isoladas, que se não misturam facilmente, que preservam o seu pequeno mundo de relações. Normalmente é porque sentem dificuldades no relacionamento e não se abrem com medo de que os outros se imiscuem demasiado na sua vida interior. Essa vida pode ser rica mas vulnerável.
Não é o caso de Cavaco. Dentro dele só está o vazio, preserva o vazio, venera o vazio. Só convive bem com números monetários. Tanto assim é que não conseguiu projectar a sua imagem no exterior. Depois de doze anos a primeiro-ministro, passou dez anos esquecido, abandonado, sem qualquer préstimo senão o de mandar alguns recados para azucrinar os seus inimigos de estimação dentro do seu próprio partido.
Foram dez anos em que nada trabalhou para a Comunidade Internacional, nada trabalhou para o País na cena internacional, trabalhou somente para amealhar mais pensões de reforma, coleccionador de capitais, usurário à velha maneira do português ronceiro e hipócrita. Cavaco Silva espera decerto a adesão às suas teses virtuais de vários quadrantes da direita. Alguém se há-de encarregar de dar corpo a uma doutrina unitária de direita, que ele apadrinhará como sendo sua.

03 janeiro 2010

Para Cavaco tudo se resolve no micro

Prosseguindo a sua cultura do cinismo Cavaco fez um discurso teatral no primeiro dia do ano que não augura nada de bom. Os alertas para uma situação explosiva não tem suficiente sustentação nos problemas enunciados e pretensos apelos a um maior intervencionismo da sua parte não se sabe se partirão de indivíduos da estirpe de Dias Loureiro e outros conselheiros.
É um discurso do tipo daquele fulano que, tremendo-lhe as pernas de medo, se vira para os seus amigos e diz: Agarrem-me senão eu mato-o. Farta-se de detectar problemas que todos conhecemos até parece querer dar a ideia que os resolveria a todos num ápice. Alerta para as intervenções que a Comunidade Europeia, agora que aderimos ao Euro, está sempre pronta a fazer cá na gestão das nossas coisas.
Vergonhas passaremos muitas ainda, mas faltará coragem a quem queira fazer intervenções drásticas na nossa economia. Viver acima das nossas possibilidades já é crónico. Mas Cavaco não teve uma palavra para a desigualdade social, nem para o escândalo das suas pensões de reformas e da necessidade de moralizar os vencimentos e mordomias de gestores de várias instituições públicas e privadas.
Cavaco nunca teve um projecto para o País, é um político casualíssimo, já se sabe o que ele defende depois dos problemas surgirem. Nada há nele de improvável e talvez tenha sido essa qualidade que o levou à Presidência. Agora temos de o aturar. Mas quem o chamou que lhe pague. O governo não tem que se submeter à vontade de quem, parece que para resolver todos os problemas, só tem uma solução.
Este homem não vende ilusões nem esconde a realidade, parece que anda aí alguém a fazê-lo. Por isso fala de propaganda, fala de desperdício, como se ele e os seus fossem exemplo de moderação e contenção. Ataca o investimento público parecendo querer apostar tudo no apoio às micro, pequenas e médias empresas. É o discurso de Ferreira Leite., está tudo dito, estamos feitos.

02 janeiro 2010

O futuro do País exige uma rotura

Quando andam tantos agoirentos a dizer que a única forma de safar este País é promover uma convergência ao centro, patrocinada pelo Presidente da República e direccionada a resolver as grandes dificuldades económicas e financeiras. Mas afinal, a agressividade evidente entre os partidos do Centrão não se refere a visões políticas profundamente divergentes, antes a uma luta por uma divisão mais favorável dos tachos.
É necessária uma rotura com a prática que continua a ser seguida da repartição das instituições existentes essencialmente pelos elementos que vivem sob a protecção dos dois partidos do centro. Mas acima de tudo é necessária uma rotura em termos de quem perfilha que valores para saber com quem se pode contar para construir um futuro mais livre. Ou caímos nas garras do liberalismo ou somos capazes de ser mais solidários.
O P.S.D. português é a ponta de lança do liberalismo, servido sob a capa de uma atenção ao social minimalista e a enveredar pelo caritativismo. É necessário fazer escolhas. O P.S.D. já as fez há muito, mas só as revela conforme as conveniências. O P.S., enlevado pelo seu papel histórico, tarda a fazê-las. Guterres achou que governar era conciliar. Sócrates está enredado em resolver questões macroeconómicas e depara-se com uma cultura de individualismo e imediatismo.
O momento da verdade pode não ser o da aprovação do orçamento de Estado de 2010, mas será necessário um grande malabarismo para que este momento seja ultrapassado. De qualquer modo a rotura necessária, inevitável, que não vai depender dos protagonistas, só vai ocorrer por ocasião das próximas eleições presidenciais. Aí não haverá desculpas.

01 janeiro 2010

Um partido desorientado, mas habituado

O P.S.D. não é um partido mas um projecto de poder. A ambição do P.S.D. é preencher os lugares de poder, estar em todo o lado, não deixar que outros a quem sejam obrigados a ceder o poder o não ocupem por muito tempo. Os percalços dos últimos quinze anos: O fim do consulado cavaquista, a fuja de Durão Barroso com a precipitação chamada Santana Lopes, foram momentos de difícil aceitação para o P.S.D.
Todo o sobressalto vivido pelo P.S.D. cria tanta perturbação, uma tão grande desorientação, um sentimento de repugnância pela mudança, pela criação ideológica, pelo debate de ideias, um incómodo que é sempre ter de escolher um líder num partido em que os pretendentes são sempre mais do que os convenientes. Não é que os lugares não cheguem para a maioria, mas há sempre umas traições mesquinhas, uns arranjos inesperados, uma vantagem em estar na linha da frente.
No entanto o P.S.D. chega facilmente ao unanimismo. Afastadas duas ou três figuras, todos os outros se submetem docilmente aos ditames do chefe, seja ele qual for. O P.S.D. não é particularmente exigente em relação ao líder. Mas colocado ele no pedestal tentam reforçar o seu valor, a sua liderança, a sua projecção. Internacionalmente Durão Barroso foi uma excepção quanto à sua projecção. De resto têm sido autênticos zeros.
Quanto ao aparelho social-democrata é de uma voracidade insaciável. Com muita gente instalada nos vários patamares do poder, não deixam de lutar pela expansão do seu domínio. As empresas públicas são um feudo seu, que os faz hesitar em relação à sua privatização. O P.S.D. vive uma luta interna entre os neo-liberais e aqueles que querem preservar um certo situacionismo, uma gestão dia a dia dos interesses instalados.
O P.S.D: não sabe estar na oposição. Não gosta de dizer o que se propõe fazer ao voltar ao governo, gosta da indefinição. Não lhe agrada discutir política, perde-se a discutir negócios. Deixa-se ir à boleia do C.D.S. ou do Bloco de Esquerda, conforme a conveniência. Tem o apoio de quase toda a imprensa, enfeudada a interesses capitais. Utiliza-a para fazer propaganda e insinuações, para lançar campanhas negras e persecutórias sobre quem se lhe opõe. No P.S.D. não há carácter.

Aqui pode vir a falar-se de tudo. Renegam-se trivialidades, mas tudo depende da abordagem. Que se não repise o que está por de mais mastigado pelo pensamento redondo dominante. Que se abram perspectivas é o desejo. Que se sustentem pensamentos inovadores. Em Ponte de Lima, como em todo o universo humano, nada nos pode ser estranho.

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"Big Man" 1998 (1,83 de altura) - Obra de Mueck

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