Há uns séculos onde se podia encontrar a nossa riqueza que não fosse na agricultura? Com os descobrimentos e o comércio marítimo houve desenvolvimento noutros sectores mas também o agrícola beneficiou.
Introduziram-se plantas trazidas da América que se adaptaram bem ao País. O milho de maçaroca, a batata, a abóbora e o feijão americano tornaram-se culturas normais, revolucionando a agricultura, aumentando a produção, mudando hábitos e práticas agrícolas. A agricultura manteve assim o seu papel destacado na economia nacional.
Com os descobrimentos beneficiou principalmente a realeza e os comerciantes e os que dependiam das suas actividades. A não ser em relação àquela inovação nos produtos, a parte que coube para o progresso do interior foi diminuta. Tudo se gastou em sumptuosidades e no litoral.
No entanto o interior sempre foi tido por rico, era a terra que dava tudo, dizia-se, apesar das suas populações viverem permanentemente em estado de necessidade e também a terem que emigrar periodicamente.
Quando havia crises, é natural que quem mais as sentia fossem as populações das cidades, mas logo o Estado tratava de colectar os “excedentes”, deixando aos agricultores o mínimo para não morrerem de fome, que as couves os iam aguentando.
Toda a actividade económica do interior se ficou sempre pela agricultura e pelo que lhe era complementar, os serviços que lhe eram prestados e o tratamento e transformação primária dos seus poucos produtos, como a madeira, o vinho, o azeite, o linho e a lã. A actividade mineira também chegou a ser significativa.
Tudo era drenado para a beira-mar, para as povoações costeiras, mesmo com privações dos residentes. Só num aspecto o interior nunca se cansou ou fartou: o de fornecer gente. Também aí estava uma riqueza.
As gentes das capitais com isso escusavam de estar preocupadas. Se era necessária gente para as naus, soldados para combater, raparigas para servir, ao interior se recorria. Assim foi até há poucos anos.
O interior nunca foi um motivo de reflexão. Lá vivia-se bem, não faltavam os passarinhos, o bom ar, o bom vinho, o pão na maceira, o porco na salgadeira e no fumeiro, o cheiro das flores silvestres.
Havia o ouro escondido algures numa arca, fosse ela de carvalho ou de pinho. Afinal a riqueza diluiu-se, os herdeiros tiraram cursos e partiram, levaram os restos para a cidade, o ouro foi ajudar a pagar a casa, alguma boiça que por lá restou é para ser todos os anos pasto das chamas.
Foi-se o ouro, ficou a paisagem, paradisíaca, diz-se, que sempre se arrastou connosco a saudade de um dia lá voltar. Mas longe vão os tempos em que era garantido que alguém ficaria, a família nunca ia toda, e os que estavam na terra tratavam de tudo e tinham-nos agarrados ao lugar
A paisagem está deserta nuns sítios, e paradoxalmente impregnada de casas por outros lados, Constrói-se de todo o tipo, renegam-se as próprias raízes, o habitat, os modos de vida, os relacionamentos. Dispersa-se tudo, nem se respeitam aldeias, nem tradições, o que interessa é ter um lugar reservado, isolado, longe dos olhares indiscretos. Não há povoamento, há ocupação.
O que era rico tornou-se pobre num ápice, quase sem darmos por ela. Quando trabalhamos, imaginamos o campo como um jardim, ambicionamos estar lá a descansar. Mas quando enfim para lá poderíamos ir verificamos a falta de sustentabilidade, o abandono e renegamos as nossas fontes. E no entanto tudo se passou vagarosamente.
Os padres ainda se passeiam pelos Centros de Dia a fazer irradiar o seu poder sobre almas desamparadas, que não é de agora, sempre precisaram da intermediação doutrem. Tudo vive mas tudo morre lentamente, com uma estranha impressão de vagar, para quem nunca teve pressa.
Que vamos fazer do interior? Depois de ter perdido a sua importância na economia nacional, como há-de recuperar, agora diversificando as actividades. A agricultura passou de actividade principal para actividade residual, cada vez menos fornecedora de emprego.
Um Centro de Dia ou um Centro de Vida? Definir polaridades, acabar com bairrismos bacocos, centralizar a Vida, Nova Vida em Centros Urbanos pré-determinados. Aplicar bem o dinheiro. O desenvolvimento em Portugal nunca foi obra do acaso, a expressão cega de forças incontroladas.
A palha protege-se aconchegada numa moreia, devidamente organizada e defendida, não no meio do campo onde rapidamente se deteriora. O campo tão depressa está um jardim como está uma selva. Um jardim custa a criar, uma selva desenvolve-se rápido.
Pensar o interior não é aplicar-lhe chavões, agarrarmo-nos a ideias feitas, a arquétipos de um outro tempo, a imagens de uma decadência sadia, comparada com a decadência das cidades industriais, mas decadência.
Pensar o interior não é só abrir auto-estradas, definir rotas turísticas, virar museológico um ambiente que exigiria outra economia, outros parceiros, outros modos de vida, outras exigências.
Os malditos índices roubam-nos a paz, o sossego, Aplicamos ao campo, a este campo que nós temos, a este interior descapitalizado e infeliz, vítima secular de todas as soberbas e ganâncias dos predadores, só sabemos aplicar-lhe estes índices de outras paragens e começarmos a exigir:
Queremos elefantes brancos e pretos, mimetismos do que existe noutros sítios, que são exemplos do seu progresso mas aqui nada dizem. Não olhamos para o fundo, o essencial, o lastro, a base à qual uma política sempre igual tem reduzido o Portugal mais profundo. Portugal é um declive para o mar.
Até já não chegam projectos, nem dinheiro, é preciso gente. Sem gente nada de útil cá vem ter, só se fazem sumptuosidades para atrair pássaros de “arribação”.
Introduziram-se plantas trazidas da América que se adaptaram bem ao País. O milho de maçaroca, a batata, a abóbora e o feijão americano tornaram-se culturas normais, revolucionando a agricultura, aumentando a produção, mudando hábitos e práticas agrícolas. A agricultura manteve assim o seu papel destacado na economia nacional.
Com os descobrimentos beneficiou principalmente a realeza e os comerciantes e os que dependiam das suas actividades. A não ser em relação àquela inovação nos produtos, a parte que coube para o progresso do interior foi diminuta. Tudo se gastou em sumptuosidades e no litoral.
No entanto o interior sempre foi tido por rico, era a terra que dava tudo, dizia-se, apesar das suas populações viverem permanentemente em estado de necessidade e também a terem que emigrar periodicamente.
Quando havia crises, é natural que quem mais as sentia fossem as populações das cidades, mas logo o Estado tratava de colectar os “excedentes”, deixando aos agricultores o mínimo para não morrerem de fome, que as couves os iam aguentando.
Toda a actividade económica do interior se ficou sempre pela agricultura e pelo que lhe era complementar, os serviços que lhe eram prestados e o tratamento e transformação primária dos seus poucos produtos, como a madeira, o vinho, o azeite, o linho e a lã. A actividade mineira também chegou a ser significativa.
Tudo era drenado para a beira-mar, para as povoações costeiras, mesmo com privações dos residentes. Só num aspecto o interior nunca se cansou ou fartou: o de fornecer gente. Também aí estava uma riqueza.
As gentes das capitais com isso escusavam de estar preocupadas. Se era necessária gente para as naus, soldados para combater, raparigas para servir, ao interior se recorria. Assim foi até há poucos anos.
O interior nunca foi um motivo de reflexão. Lá vivia-se bem, não faltavam os passarinhos, o bom ar, o bom vinho, o pão na maceira, o porco na salgadeira e no fumeiro, o cheiro das flores silvestres.
Havia o ouro escondido algures numa arca, fosse ela de carvalho ou de pinho. Afinal a riqueza diluiu-se, os herdeiros tiraram cursos e partiram, levaram os restos para a cidade, o ouro foi ajudar a pagar a casa, alguma boiça que por lá restou é para ser todos os anos pasto das chamas.
Foi-se o ouro, ficou a paisagem, paradisíaca, diz-se, que sempre se arrastou connosco a saudade de um dia lá voltar. Mas longe vão os tempos em que era garantido que alguém ficaria, a família nunca ia toda, e os que estavam na terra tratavam de tudo e tinham-nos agarrados ao lugar
A paisagem está deserta nuns sítios, e paradoxalmente impregnada de casas por outros lados, Constrói-se de todo o tipo, renegam-se as próprias raízes, o habitat, os modos de vida, os relacionamentos. Dispersa-se tudo, nem se respeitam aldeias, nem tradições, o que interessa é ter um lugar reservado, isolado, longe dos olhares indiscretos. Não há povoamento, há ocupação.
O que era rico tornou-se pobre num ápice, quase sem darmos por ela. Quando trabalhamos, imaginamos o campo como um jardim, ambicionamos estar lá a descansar. Mas quando enfim para lá poderíamos ir verificamos a falta de sustentabilidade, o abandono e renegamos as nossas fontes. E no entanto tudo se passou vagarosamente.
Os padres ainda se passeiam pelos Centros de Dia a fazer irradiar o seu poder sobre almas desamparadas, que não é de agora, sempre precisaram da intermediação doutrem. Tudo vive mas tudo morre lentamente, com uma estranha impressão de vagar, para quem nunca teve pressa.
Que vamos fazer do interior? Depois de ter perdido a sua importância na economia nacional, como há-de recuperar, agora diversificando as actividades. A agricultura passou de actividade principal para actividade residual, cada vez menos fornecedora de emprego.
Um Centro de Dia ou um Centro de Vida? Definir polaridades, acabar com bairrismos bacocos, centralizar a Vida, Nova Vida em Centros Urbanos pré-determinados. Aplicar bem o dinheiro. O desenvolvimento em Portugal nunca foi obra do acaso, a expressão cega de forças incontroladas.
A palha protege-se aconchegada numa moreia, devidamente organizada e defendida, não no meio do campo onde rapidamente se deteriora. O campo tão depressa está um jardim como está uma selva. Um jardim custa a criar, uma selva desenvolve-se rápido.
Pensar o interior não é aplicar-lhe chavões, agarrarmo-nos a ideias feitas, a arquétipos de um outro tempo, a imagens de uma decadência sadia, comparada com a decadência das cidades industriais, mas decadência.
Pensar o interior não é só abrir auto-estradas, definir rotas turísticas, virar museológico um ambiente que exigiria outra economia, outros parceiros, outros modos de vida, outras exigências.
Os malditos índices roubam-nos a paz, o sossego, Aplicamos ao campo, a este campo que nós temos, a este interior descapitalizado e infeliz, vítima secular de todas as soberbas e ganâncias dos predadores, só sabemos aplicar-lhe estes índices de outras paragens e começarmos a exigir:
Queremos elefantes brancos e pretos, mimetismos do que existe noutros sítios, que são exemplos do seu progresso mas aqui nada dizem. Não olhamos para o fundo, o essencial, o lastro, a base à qual uma política sempre igual tem reduzido o Portugal mais profundo. Portugal é um declive para o mar.
Até já não chegam projectos, nem dinheiro, é preciso gente. Sem gente nada de útil cá vem ter, só se fazem sumptuosidades para atrair pássaros de “arribação”.
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