Repentinamente, lembrei-me que em tempos, e hoje ainda que esporadicamente, ocorrem factos semelhantes a este no Portugal profundo. Uma freguesia inteira, com meia dúzia de excepções, dizia cobras e lagartos do padre. Não lhe poupavam insultos e maldições à boca pequena, mas quando chegava a hora, todos se engalfinhavam para pegar ao pálio.
Estas falsidades estão-nos na alma. Quando das coisas sérias se faz espectáculo, sujeitamo-nos a isto, ou antes, sujeitam-se aqueles que também queriam levar a água ao seu moinho. Porque agora pouco poderão dizer que abominam estes exercícios de memórias e suposições.
Supostamente Salazar teria possibilidades de se submeter em certos períodos do seu reinado a actos plebiscitários e de os ganhar, mas a desconfiança estava-lhe na alma e quando os realizou foi fraudulentamente.
Nada disto me custa aceitar, o que me choca é que as pessoas, obcecadas que andam por denegrir o Estado, não vislumbrem que se não têm memória deveriam ter feito suposições bem mais sérias do que as que fizeram.
Salazar nunca fez plebiscito sérios, muito menos faria eleições. Salazar assumiu-se como um cruzado e, tendo sido padre sem nunca dizer missa, aproveitou-se da religião para a sua cruzada, sabendo que há um anti-clericalismo por vezes feroz na intelectualidade mas fraco e inconsequente nas camadas populares.
Salazar criou aliados, suficientes para darem à população uma ideia de força, incentivou a apatia e o semi-analfabetismo, delimitou o campo inimigo, tão pequeno quanto possível, mas remetendo para lá quantos manifestassem alguma opinião contrária.
Uma das razões para a sua vitória, fruto do activismo de uns brincalhões que nós somos, foi dada como residindo no facto de que Salazar tornou o Estado uma pessoa de bem. Desvaloriza-se o peso da máquina repressiva constituído pela polícia política e seus tentáculos, de que muitos se esquecem.
Claro que se lhe dermos o crédito desta suposição hoje o peso do Estado é incomparavelmente maior. Incluamos nele, como é devido, todos os poderes, como as Câmaras Municipais e outros, aquelas instituições que provocam um efeito padronizador de hábitos e comportamentos, veremos que ele exerce um poder incomensurável e muita gente se sente saudosista da simplicidade de outros tempos.
Uma simplicidade que paradoxalmente também é vista se o modelo for Álvaro Cunhal, pessoa que se ensandeceu por ter lutado com tão pouca companhia contra um poder de raízes tão profundas. Também Cunhal tentou restringir as opções a dicotomias imperfeitas de que este final é exemplar.
Os seus discípulos querem manter viva uma luta digna no seu tempo, mas só o conseguem fazendo todas as suposições favoráveis, com a premissa que herdaram de que a sua ideia sairá sempre vitoriosa, nem que para tanto tenham que ir redimensionando continuamente em baixa os seus objectivos.
Cunhal não mereceria o título em disputa, mas também não merecia que o pusessem a lutar contra fantasmas. É a vontade de estar sempre presente em todas as lutas, a vã pretensão de dar seriedade a uma coisa feita a brincar, é querer manter vivo quem no pós 25 de Abril nos não deixou sonhar.
Salazar é um fantasma que, caso renascesse, não seria ilegível porque já não saberia viver neste tempo. Salazar no seu tempo foi um déspota primário, que soube manipular, assustar e deslumbrar mas hoje não enganaria ninguém.
Cunhal brilhou porque num só ano conseguiu criar alguma realidade e muita ilusão sobre um partido pequeno com uma grande influência, mas que ele nunca reconheceu como somente a manifestada nas eleições. No restante foi um retroceder continuo que só tem como coroa de glória não ter criado vítimas.
O que faltou a quem fez tão bizarra escolha é o senso das realidades perante as quais reagem. Hoje é verdade que o Estado assume um carácter absoluto como não tinha noutros tempos, mas não é politicamente despótico, é-o no sentido de haver um interesse colectivo que o Estado assume como nunca tinha assumido até ao presente em Portugal.
O desenvolvimento não se compadece com os processos mais defensores dos direitos individuais que nos estão na memória, mesmo sem nunca terem sido reais, e de que hoje se faz facilmente tábua rasa. Perante o colectivo relativizam-se direitos e quase se espezinham.
As pessoas atemorizam-se com a complexidade crescente do Estado e com o número crescente de pessoas que dele dependem. Há crescentes direitos de que podemos usufruir mas muitos só na teoria. Neste sentido o Estado actual pode não ser uma pessoa de bem, mas seguramente que o Estado não democrático é efectivamente uma pessoa de mal.
Outra razão invocada foi o papel primordial dado por Salazar à Nação. É dos conceitos necessários e que paradoxalmente só se firmou quando tivemos que bater o pé (moralmente) contra o País a quem devemos a nossa existência, a Inglaterra. Isto só mostra que é necessário redefini-lo e aproximar mais o Estado da Nação, sem desta fazer nada de estático.
Em democracia até das brincadeiras de mau gosto podemos tirar conclusões.
Estas falsidades estão-nos na alma. Quando das coisas sérias se faz espectáculo, sujeitamo-nos a isto, ou antes, sujeitam-se aqueles que também queriam levar a água ao seu moinho. Porque agora pouco poderão dizer que abominam estes exercícios de memórias e suposições.
Supostamente Salazar teria possibilidades de se submeter em certos períodos do seu reinado a actos plebiscitários e de os ganhar, mas a desconfiança estava-lhe na alma e quando os realizou foi fraudulentamente.
Nada disto me custa aceitar, o que me choca é que as pessoas, obcecadas que andam por denegrir o Estado, não vislumbrem que se não têm memória deveriam ter feito suposições bem mais sérias do que as que fizeram.
Salazar nunca fez plebiscito sérios, muito menos faria eleições. Salazar assumiu-se como um cruzado e, tendo sido padre sem nunca dizer missa, aproveitou-se da religião para a sua cruzada, sabendo que há um anti-clericalismo por vezes feroz na intelectualidade mas fraco e inconsequente nas camadas populares.
Salazar criou aliados, suficientes para darem à população uma ideia de força, incentivou a apatia e o semi-analfabetismo, delimitou o campo inimigo, tão pequeno quanto possível, mas remetendo para lá quantos manifestassem alguma opinião contrária.
Uma das razões para a sua vitória, fruto do activismo de uns brincalhões que nós somos, foi dada como residindo no facto de que Salazar tornou o Estado uma pessoa de bem. Desvaloriza-se o peso da máquina repressiva constituído pela polícia política e seus tentáculos, de que muitos se esquecem.
Claro que se lhe dermos o crédito desta suposição hoje o peso do Estado é incomparavelmente maior. Incluamos nele, como é devido, todos os poderes, como as Câmaras Municipais e outros, aquelas instituições que provocam um efeito padronizador de hábitos e comportamentos, veremos que ele exerce um poder incomensurável e muita gente se sente saudosista da simplicidade de outros tempos.
Uma simplicidade que paradoxalmente também é vista se o modelo for Álvaro Cunhal, pessoa que se ensandeceu por ter lutado com tão pouca companhia contra um poder de raízes tão profundas. Também Cunhal tentou restringir as opções a dicotomias imperfeitas de que este final é exemplar.
Os seus discípulos querem manter viva uma luta digna no seu tempo, mas só o conseguem fazendo todas as suposições favoráveis, com a premissa que herdaram de que a sua ideia sairá sempre vitoriosa, nem que para tanto tenham que ir redimensionando continuamente em baixa os seus objectivos.
Cunhal não mereceria o título em disputa, mas também não merecia que o pusessem a lutar contra fantasmas. É a vontade de estar sempre presente em todas as lutas, a vã pretensão de dar seriedade a uma coisa feita a brincar, é querer manter vivo quem no pós 25 de Abril nos não deixou sonhar.
Salazar é um fantasma que, caso renascesse, não seria ilegível porque já não saberia viver neste tempo. Salazar no seu tempo foi um déspota primário, que soube manipular, assustar e deslumbrar mas hoje não enganaria ninguém.
Cunhal brilhou porque num só ano conseguiu criar alguma realidade e muita ilusão sobre um partido pequeno com uma grande influência, mas que ele nunca reconheceu como somente a manifestada nas eleições. No restante foi um retroceder continuo que só tem como coroa de glória não ter criado vítimas.
O que faltou a quem fez tão bizarra escolha é o senso das realidades perante as quais reagem. Hoje é verdade que o Estado assume um carácter absoluto como não tinha noutros tempos, mas não é politicamente despótico, é-o no sentido de haver um interesse colectivo que o Estado assume como nunca tinha assumido até ao presente em Portugal.
O desenvolvimento não se compadece com os processos mais defensores dos direitos individuais que nos estão na memória, mesmo sem nunca terem sido reais, e de que hoje se faz facilmente tábua rasa. Perante o colectivo relativizam-se direitos e quase se espezinham.
As pessoas atemorizam-se com a complexidade crescente do Estado e com o número crescente de pessoas que dele dependem. Há crescentes direitos de que podemos usufruir mas muitos só na teoria. Neste sentido o Estado actual pode não ser uma pessoa de bem, mas seguramente que o Estado não democrático é efectivamente uma pessoa de mal.
Outra razão invocada foi o papel primordial dado por Salazar à Nação. É dos conceitos necessários e que paradoxalmente só se firmou quando tivemos que bater o pé (moralmente) contra o País a quem devemos a nossa existência, a Inglaterra. Isto só mostra que é necessário redefini-lo e aproximar mais o Estado da Nação, sem desta fazer nada de estático.
Em democracia até das brincadeiras de mau gosto podemos tirar conclusões.
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