31 maio 2008

A humildade vista pelos imbecis

Quando se faz um rol de qualidades de alguém, se se falar de humildade, é lá para o fim da lista que se põe e nunca se coloca como imprescindível, seja para que for. Muitas vezes até é considerado como grave defeito pela forma como pode afectar a determinação e empenho necessários para atingir um objectivo difícil.
Até se chega mesmo ao ponto de ter a humildade como factor inibidor. Esta qualidade não deve ser possuída por quem quer ter a obstinação necessária para chegar de qualquer modo a um dado ponto, isto é, sem ser escrupuloso. Efectivamente a maioria das pessoas que sobressaem na sociedade já pontapearam outras e a sua humildade só pode ser pretensão.
Podendo a humildade dar origem a coisa tão desprezível como a pretensão, será de a manter como qualidade e de a cultivar como objectivo? Temos que ver que em certos contextos sociais ela é própria dos vencidos da vida e noutros é mesmo própria daqueles que se sentem derrotados à partida. Há decerto terrenos sociais tão inóspitos que a humildade neles não medra, porque a indiferença que sobre ela recai faz desanimar o mais moralizado.
Há porém uma humildade genuína, que está entre a que é imposta, forçada e a que é pretensiosa, vácua. Mas que será sempre muito associada à ingenuidade pelos imbecis que fazem da honra a sua forma mais musculada de se relacionarem com os outros. Os imbecis são o perigo porque são menos esclarecidos e em muito maior número que os poderosos.
Os imbecis confundem humildade com subserviência, metem tudo no mesmo saco para não terem só más companhias. Mas os humildes são merecedores de igual respeito ao que os honrados exigem para si. Para se ser humilde tem que se ser honrado, mas não precisar das armas normalmente atribuídas a quem quer defender a honra para fazer a imposição do respeito devido.

30 maio 2008

A ilusão da classe média

Será a rampa de lançamento do Partido Verdadeiramente Xocialista? O primeiro pretexto para um contacto exploratório é uma festa de cultura, diz-se. Que esta aproximação entre Louçã e Alegre seja o primeiro passo para uma plataforma programática comum é problemático, porque um festejo comum é pouco para um programa de governo.
Louçã e Alegre convergem na postura justicialista. O Louçã anseia por criar vítimas do seu sarcasmo. O Alegre é mais comedido e anseia por criar vítimas dos sonhos irrealizados. Ambos se alimentam de sangue na medida em que é única maneira de subsistirem, isto é, de darem alguma razão à sua sensibilidade, no modo particular como cada um vê o mundo e constrói o seu.
Louçã é do partido de esquerda sem proletários e sem sindicatos, aglutinador dos restos da ortodoxia comunista que não arrastam exércitos. Alegre é Alegre, com a melancolia intelectual de quem vê o seu estatuto de infiltrado na política a diluir-se, de quem já não consegue ser referência senão para aristocratas de esquerda falidos, que não souberam aproveitar a sua ocasião, e pregadores sem céu para prometerem.
Estes ilusionistas aparecem agora a dirigir-se às classes médias, não para lhes resolver os problemas, mas para obter o luzimento que só elas podem dar, o reconhecimento referencial que todos procuram. Falam-lhes com uma linguagem de esquerda maximalista a prometer-lhes aquilo que só a direita lhes pode dar.
Quando um político destes tem a ilusão de ganhar umas eleições, de subir nas preferências, cai no esparrela de adoptar a linguagem do sector da classe média que lhe está mais próximo, corre o risco de não ser entendido pela restante classe média, e decerto não capta a simpatia de quem vive dificuldades sérias, mas não vai em ilusões.

29 maio 2008

A generosidade, a caridade e a disparidade

Não é possível confundir generosidade com caridade. A generosidade, que não é só propósito, consta de actos pessoais unívocos, sem retorno, incompensáveis. A generosidade que interessa é a que resulta de um empenho permanente, sem cálculos circunstanciais, e que se expande pela reprodução voluntária.
A caridade é um método cujos actos resultantes são enquadráveis numa forma específica de organização social. Há porém regimes que rejeitam a caridade, tomando-a como anti-social na medida em que preconizam que todos os membros da sociedade deverão não precisar dela, como deverão também contribuir para o produto social que a dispensa.
Há outros regimes que incentivam a caridade porque é a forma que encontram para suprir as lacunas que o sistema social proporciona. A caridade assume assim um carácter sistémico, fluindo ao sabor das necessidades circunstanciais. Importante no passado como forma de solidariedade esporádica, esta caridade não tem hoje, dentro dos limites nacionais, qualquer razão para ser invocada. Esta sociedade, obrigatoriamente, tem que ter outros instrumentos para que a solidariedade seja permanente e eficaz.
É necessário não ser intelectualmente promíscuo, não baralhar e confundir conceitos. Os caritativos de hoje são aqueles que falharam e sempre falharão na gestão das expectativas sociais. Esta sociedade exige cada vez mais generosidade para sermos capazes de aceitar, compreender e tentar contribuir para a resolução das suas discrepâncias.
Novas formas de desenraizamento, desinserção, exclusão social surgirão e é necessário encará-los com a generosidade de quem é o responsável pela imperfeição deste mundo. Não podemos tratar os problemas com flores, mas temos de interagir com eles para poder minimizar as desigualdades. A caridade não vence as disparidades sociais.

28 maio 2008

Uma mudança saudável de clamor

Os clamores têm o seu tempo e o seu lugar. Às vezes as circunstâncias mais imprevistas alteram de modo menos favorável estes clamores programados. Este aumento do preço do petróleo não é só mais um problema que se junta a outros de que se falava, é o problema.
Como tal até se pode dizer que, sendo grave problema e ainda por cima de origem totalmente exterior, veio criar uma certa folga ao governo. A oposição só está preparada para soluções conjunturais pelo que agora, perante a necessidade de apresentar soluções estruturais para o País, patina como qualquer um que em cima do gelo lhe trocam o passo.
Pela lado da dita esquerda, outrora internacionalista e libertária, só vimos padres sem batina a arengar sobre os malefícios da globalização, contra os países do terceiro mundo que querem fazer valer mais os produtos que a rapina que o primeiro mundo há séculos vem fazendo desvalorizou.
Pelo lado da direita as soluções propostas não saem das mezinhas do costume, que visam perpetuar as diferenças sociais gritantes existentes, limando de vez em quando as suas arestas mais agressivas. Para tão fracos propósitos usam a linguagem mais iníqua, de maximalistas à moda tradicional do reviralho, o que, é significativo, tem feito fugir os votos para esse lado.
Para cúmulo entra em acção o sumo-sacerdote acenando com o medo dos comunistas, da nova e da velha esquerdas, com a necessidade de uns remendos na política, que ele nunca foi capaz de criar uma base nacional firme de qualificação, de negócio, de tecnologia, de saber fazer.
Virem a clamor para outro lado, para a solidariedade internacional, para a luta contra estas tentativas de nos recolocarmos na concha do nosso falso sossego, para enfrentarmos a sério o problema ambiental, as questões energéticas. Tentemos resolver os problemas nos largos espaços, com visões globais, soluções globais, sem a mesquinhez destes aduladores da própria imagem.

27 maio 2008

As difíceis condições da generosidade

Não é generoso quem quer, mas tão só quem pode. Esta asserção aplicar-se-á a outras qualidades, mas em relação a esta assenta bem. Há pessoas que sofrem de tais dificuldades, vivem privadas de qualquer qualidade, que pedir-lhes para serem generosas atingiria as raias da provocação.
Também se não dá valor ao facto de pessoas assim, nessas condições ou circunstâncias, puderem possuir ideias generosas, propagá-las e gratificar quem as partilha. Se as pessoas são de tal maneira indefesas que se tivessem ideias malignas também as não poderiam pôr em prática, nem umas nem outras serão de considerar para efeitos de perigosidade do ambiente social.
Ser generoso é ter ideias que assim possam ser consideradas, propagandeá-las e fazer crer aos outros que compensa ser generoso. Ser generoso é estar apto a praticar a generosidade, sem que ninguém nos possa impor datas e limites. Ser generoso é garantir a capacidade e preparar-se para repudiar os afrontamentos que sempre se fazem.
Na generosidade não se procuram compensações, tão só gratificações pessoais voluntárias, lealdade, atitudes dignas. A generosidade teme e dispensa atitudes hostis, arrogância e prepotência. Não se pode ser generoso quando se é coagido, quando sobre nós imperam limitações inaceitáveis.
Poucas coisas nos custarão tanto como constatarmos que deixamos de ter condições para ser aquilo que alguma vez fomos, neste caso, generosos. A nossa generosidade poderá ficar somente pelos propósitos, se os imperativos da sobrevivência implicarem o uso de diferentes meios. É neste sentido que todos nós somos inocentes.

26 maio 2008

Quatro candidatos perdidos entre sombras e miragens

Seria suicidário alguém que se propusesse liderar o PSD se não propusesse também derrotar o PS nas próximas eleições. No entanto a maneira como formulam este propósito, vincando bem o nome do Primeiro-Ministro, assume raias de tentativa de apropriação de uma obstinação patológica, que só por si garanta a satisfação desse objectivo.
Á falta de ideias, começando por Ferreira Leite, que já deu tudo o suco que tinha a dar, todos se viram para considerações de alcance meramente pessoal, relevando os seus méritos e tentando denegrir, obscurecer, tapar quaisquer méritos que José Sócrates possa ter, que tem, conteste-se ou não com afirmações desmioladas, de gente sem carácter.
O Passos Coelho parecia o candidato diferente, que reconduziria o PSD a um trilho respeitável, que se não apresentaria vinculado a posições passadas, que poria o interesse nacional à frente das argumentações falaciosas dos seus pares mais comprometidos. Puro engano. O homem que apareceu à margem do aparelho partidário está a ser aprisionado por este.
Se o fato faz o monge então Patinha Antão não surpreende minimamente, igual ao que sempre foi. São estranhos os propósitos deste homem mas decerto haverá quem lhe conheça algum mérito para além de ser porta-voz, um bom discípulo da mais pura ortodoxia “social-democrata”.
Santana Lopes persegue não já um projecto, mas uma obsessão. No fundo ele dá à sua passagem pelo executivo um carácter tão passageiro, tão irrelevante, como se lhe tivessem minado o caminho, mas o tivessem avisado, não fosse ele morrer. Por isso mesmo no governo nunca pôs os pés na terra, limitou-se a andar por aí. Não vê alto, mas do alto vê miragens.

25 maio 2008

A solidariedade deve ter em conta a dignidade pessoal

A dignidade é um daqueles valores civilizacionais que mais tem a ver com a estrutura da sociedade. Se nuns locais é perfeitamente legitimo que cada um providencie em relação à sua própria sobrevivência, noutros já se acha que, em relação aos mais dependentes, essa responsabilidade deve ser assumida pelo Estado, por Instituições de Solidariedade ou até pela caridade quase obrigatória.
Hoje está mais ou menos assumido que a sociedade deve assentar num valor de carácter universal, que é a solidariedade. As suas diferentes estruturas dão origem a formas diversificadas de exercer essa solidariedade. Muitos acharão que nunca será suficiente, que a sociedade cria mais impedimentos ao desenvolvimento pessoal do que de si própria.
Caminhamos para que se acentue uma luta pela dignidade, pela solidariedade, que já nada tem a ver com a luta de classes tradicional. Conceitos como a igualdade tem sido abandonados por absolutamente impraticáveis, se não talvez como igualdade de oportunidades. Como compatibilizar a solidariedade social que se reclama com a dignidade pessoal que se quer elevar à mais alta condição?
A solidariedade social não se pode obter através da quebra da dignidade pessoal. É necessário combater aqueles que dobram as pernas só para conseguirem ter as melhores condições com os menores sacrifícios pessoais. A esperteza daqueles que fazem isso não é favorável à sua dignidade. Aqueles que acham que já fizeram tudo, que é a sociedade que está em dívida para com eles, raramente têm razão.
A solidariedade praticada pela sociedade deve ter em conta a dignidade, de modo a contribuir para ela, para que não a coloque num estado de hibernação, muito menos para criar uma situação humilhante. Em períodos de crise quebra-se a vigilância social, relaxa-se o espírito crítico, por vezes contribui-se para tornar situações passageiras em definitivas e socialmente críticas.

24 maio 2008

A dignidade não é um paradigma da nossa civilização

A luta dos homens pela sua dignidade é uma tarefa sem fim. Há no entanto uma larga flexibilidade na definição deste conceito, que leva a que a sua conceitualização seja também uma tarefa sem fim. Cada sociedade tem mais ou menos consensualizado um conceito, mas ele é tão pouco abordado, tão ignorado no discurso mediático, que, quando referido, cria diferentes emoções nas diferentes pessoas.
Para uns garantir a dignidade da pessoa humana é tão só assegurar os seus meios de defesa, o não ser preso sem intervenção judicial. Para outras, porém, a dignidade tem uma vastidão muito maior, que passa por ter garantidos os meios de subsistência, sem necessitar da caridade alheia.
A dignidade é um conceito que varia conforme o desenvolvimento da sociedade, está em tudo dependente da evolução técnico-científica e cultural. A dignidade envolve a pessoa, os grupos e toda a sociedade, quando ela se fortalece ou falha a todos estes níveis se sente a sua repercussão. Se fosse possível quantificar a dignidade era um excelente índice civilizacional.
No entanto a dignidade, mesmo a menos exigente, das pessoas é a toda a hora ofendida. Em primeiro lugar pelas próprias pessoas que são demasiado vulneráveis aos seus próprios caprichos. Em segundo pelas pessoas que só acentuam os aspectos materiais, relativizando todos os outros valores que, sem desprezar aqueles, deveriam seguir, se possível, em ritmo mais acentuado.
Se as pessoas se não entendem sobre a sua própria dignidade, o que vão exigir que seja respeitado da parte dos grupos, da sociedade, do Estado? Por esta razão vemos cada vez menos a dignidade a ser usada como um paradigma da nossa sociedade.

23 maio 2008

Acumulação de capital e desigualdade social

Não é o facto de muitas pessoas gostarem de abordar o tema de uma cada vez maior desigualdade social sob uma perspectiva demagógica que nos deve a calar esta questão. O preconceito ideológico continua a inquinar uma discussão séria sobre a imoralidade, a ineficiência e o desperdício que são gerados por efeito de uma desigualdade tão acentuada como a portuguesa.
Aqueles que acham que a acumulação capitalista só deve ser promovida pelo Estado dizem ter a solução para a questão, mas noventa anos de experiências só levantaram mais problemas do que os que resolveram. Temos pois que conviver com a acumulação privada de capital, sem que permitamos que os cavaleiros da banca sejam os governantes do País.
Estamos na linha da frente da desigualdade, como estamos na linha de trás da organização e do conhecimento. A senda do desenvolvimento só é possível com a junção destes elementos, numa colaboração estreita tendo por pano de fundo a satisfação das necessidades de um mercado disponível.
Muito capital em poucas mãos não garante a sua utilização em proveito da sociedade. A dispersão do trabalho por muitas mãos não garante a sua eficiência, nem a sua remuneração conveniente. Trabalho mal pago e capital bem lucrativo além de ser uma imoralidade, promovem o mal-estar social e o desperdício.
Em especial com a nossa entrada na Comunidade Europeia, criou-se um afã em atingir os salários idênticos aos dos outros países. Claro que só os que detêm poder reivindicativo o vão conseguindo e alguns ultrapassando. O efeito de arrastamento que muitos diziam que se iria produzir sobre os salários menores, transformou-se num efeito de isolamento de quem menos ganha.
Além do drama daqueles que não chegam a encontrar trabalho, os que o encontram em muitos casos não conseguem com ele garantir uma sustentação capaz, mesmo numa perspectiva muito restritiva. É bom que a Comunidade se debruce sobre esta questão.

22 maio 2008

Uma clarificação necessária no espaço jornalístico

Segundo o Público de 12-05-2008 há vários autarcas com interesses em empresas da construção civil e imobiliário, que se sabe serem aquelas que fazem um cerco de mais perto às Câmaras municipais, para poderem obter facilidades e contratos favoráveis aos seus negócios.
Já se sabe que neste País não há qualquer vergonha nos negócios entre as pessoas, quando mais quando de um lado está uma Instituição Pública cujos gestores tratam como seus os bens públicos. Delapida-se o que não é deles, dá-se largas à fealdade e ao oportunismo.
Ninguém que conheça casos menos claros, se não tiver um motivo muito forte, se vai meter em trabalho por os denunciar. Os autarcas no geral são vingativos, mesmo quando não se fala de corrupção, não dissociam a qualidade da sua gestão, do seu perfil pessoal na vida social, tomam qualquer ataque àquela como de índole pessoal.
O mesmo Jornal se refere aos interesses existentes dos autarcas em órgãos de comunicação social, de que se destaca a detenção de quotas em empresas proprietárias de rádios locais. O Presidente da Câmara Municipal de Ponte de Lima, Daniel Campelo, é referido como estando incluído neste grupo.
Em termos de interesses, estes parecem mais da área defensiva do que envolvendo interesses económicos. A posse de uma quota pode representar somente a capacidade de uma intervenção na orientação editorial do órgão de comunicação em causa.
Era bom que Daniel Campelo assumisse a propriedade dessa quota, no sentido de clarificar a independência dessa rádio, ou jornal, o que não parece claro. Podemos estar a formular falsos juízos e isso não é saudável.

21 maio 2008

Manobra de diversão ou revelação de um acto ignóbil

Parece evidente que quando há alguma denúncia há sempre uma razão para que ela aconteça. Quando se trata de pessoas, pode ser que o façamos porque quem é prejudicado nos merece mais consideração do que o que prejudica. Cumprimos com a obrigação de amizade.
Muitos agirão assim porque, independentemente do denunciante, o delator merece ser castigado na nossa perspectiva pessoal, mas o nosso sentido de justiça nem sempre actua se estes aspectos se não colocarem. Então, quando o prejudicado é o Estado, muitos de nós até aplaudimos.
Tanto se rouba nas autarquias, tanta corrupção vai por todo o País, que era uma milagre aparecerem dois cavalheiros de Felgueiras a denunciarem a Fátima Felgueiras, tida como mulher conceituada e de porte intocável. Haverá decerto motivo para estes senhores adoptarem o papel de justiceiros que lutam pelo castigo dos prevaricadores.
Segundo o testemunho de um magistrado, primo da ré, o motivo está em que a Fátima se não ter rendido aos dotes de sedução dos tais indivíduos. Não se tratou pois do milagre que nos espantaria, do mais puro amor à justiça, mas de uma paixão no seu grau mais exacerbado, que pretende ver o seu objecto humilhado a seus pés.
Objectivamente a justiça deve ser cega, não é a qualidade dos denunciantes que retirará o valor às denúncias. Mas parece evidente que só o teriam feito para compensar a sua insatisfação sexual com a satisfação de um instinto primário de punição.
F. F. será condenada ou não, mas decerto não merecia ter chegado a ré por esta via. Corajosa na defesa da sua honra, falta saber se ela confirmará os factos. Eles não estarão livres de que se questione porque estiveram calados durante tanto tempo, se não seria porque entretanto alimentaram a esperança de que, sendo coniventes nos segredos do saco azul, também teriam direito a partilharem os segredos da alcova.

20 maio 2008

A humildade vive da confiança e da lealdade

Os humildes são aqueles que entre o poder e a confiança escolhem a confiança. O poder é o mais seguro atributo que geralmente as pessoas consideram para lhes garantir autonomia, independência, auto-suficiência, consideração, reconhecimento, respeitabilidade, dignidade.
É verdade que a maioria dos poderes não são absolutos e portanto não asseguram que o seu relacionamento tenha aquelas características de modo absoluto. No geral todos dependem de alguém que detém ainda mais poder, mas, porque também este não é detentor de poder absoluto, tem de manter um certo equilibrio com superiores e subordinados.
Porém por menos apelativo que o poder seja, é difícil resistir à sua sedução. O poder é algo com que se têm que aprender a viver. O humilde também não rejeita o poder mas acha que ele deveria assentar numa base de confiança. O humilde rejeita viver num clima de suspeição. O humilde privilegia a lealdade e rejeita em absoluto a fidelidade.
O humilde aceita negociar mas rejeita a insídia. O humilde aceita o poder mas rejeita a prepotência e a sobranceria. O humilde aceita a sabedoria mas rejeita a insolência. O humilde acredita na confiança, livremente estabelecida, sem coacção e contrapartidas. O humilde rejeita que a desconfiança se transforme em preconceito.

19 maio 2008

Que podemos fazer para pertencer ao grupo dos humildes?

Normalmente são considerados humildes aqueles que não ambicionam muito mais do que aquilo que têm. Mas, não é por achar ter merecimento para ter mais do que aquilo que tem, que a alguém deve ser recusada essa qualidade. Assim como, a quem achar que tem mais do que devia, ela lhe deve ser atribuída automaticamente.
Normalmente são considerados humildes aqueles que possuem em menor grau a esperteza que achamos ser necessária para ter sucesso nesta sociedade. Também não parece dever ser por aí que esta qualidade deve ser ou não atribuída. Se há aspectos da esperteza que devem ser suficientes para nos retirar do grupos dos humildes, de certo que o simples facto de não possuirmos nenhuma esperteza também não nos dá entrada imediata.
Normalmente são considerados humildes aqueles que estão mais longe do poder, como se este pudesse atribuir ou retirar uma qualidade que se pode ver pela postura na vida, quer se detenha ou não poder. Sendo o poder uma necessidade de que a humanidade ainda se não conseguiu livrar, só é ilegítimo quando assenta em regras que aceitam a corrupção.
Todas as noções que colocam os humildes num extremo qualquer de uma escala que sirva para medir outros factores pessoais ou sociais são noções redutoras que mais não pretendem ser que meio caminho para chegarmos a noções que se confundem com o menosprezo, o desprezo e que no seu extremo até têm por fim a humilhação.

18 maio 2008

Será perder tempo a criação de estados de confiança?

Uma sociedade confiante é muito mais eficiente, mais produtiva e menos cansativa. Se essa confiança se estabelece com naturalidade os ganhos ainda são maiores. Mas este facto só por si não garante que essa sociedade seja saudável, tenha objectivos que todos perfilhemos. Um clima de confiança numa sociedade fechada pode ser perigoso para os vizinhos.
Hitler conseguiu a confiança do seu povo porque esse povo estava à espera de alguém capaz de responder à humilhação a que, desde a derrota na primeira guerra mundial, o povo alemão estava submetido. Após a segunda guerra mundial, os aliados não caíram na asneira de querer resolver a questão alemã da mesma forma como a quiseram resolver após 1918.
As circunstâncias ditam a maioria dos estados de confiança que julgamos serem fruto da mais pura naturalidade. O que não podemos pensar é que as pessoas são especialmente pérfidas, senão que há umas que são mais susceptíveis que outros, mais influenciáveis, mais vulneráveis. Por isso não há nada como prevenir e não criar as circunstâncias propícias.
As sociedades são produtos de séculos de evolução, de avanços e retrocessos. Por vezes julgamos que tudo se vai desmoronar, que toda a confiança possível se volatiliza sem que possamos fazer nada contra isso. São momentos que julgamos ajustados a salvadores, a líderes naturais, a seres inimitáveis capazes de nos livrar deste incómodo de trabalharmos para cimentar uma nova confiança na sociedade.
A confiança não pode ser fruto da preguiça mas deve ser do empenho. Devemos estar preparados para “perder” algum tempo a criar um clima de confiança indispensável a uma vida saudável. Isto implica um esforço mútuo, evitando ao máximo o perigo de nos andarmos a enganar. Só temos vantagem em sermos claros, humildes e pacientes.

17 maio 2008

Estados de confiança de natureza diferente

A sociedade não existiria se entre as pessoas se não estabelecessem estados de confiança. A sua quebra não é qualquer drama porque outros irão resistindo e dando à sociedade o cimento que a mantém viva, que a não deixa desmoronar.
Um estado de confiança que se estabelece entre duas pessoas não é na maioria dos casos uma construção intelectual. Quando assim é torna-se necessário ver se há algum ascendente intelectual de uma das parte sobre a outra e se esse ascendente é reconhecido como tal. Porque só uma relação que se estabeleça em equilíbrio tem a solidez necessária.
Quando um estado de confiança se cria com base numa construção intelectual existe uma grande vantagem se houver necessidade da sua desconstrução. Não se trata de calculismo. Porque sabemos como e porquê se chegou a esse estado, também saberemos como desmontar a construção, sem que fiquem feridas expostas.
Não existe hipocrisia nesta espécie de relacionamento. Hipocrisia existe se um dos lados dá por adquirida a confiança sem que existam condições para tal, mas porque isso servirá os seus interesses imediatos. Este estado de confiança não é diferente neste aspecto. Só existirá se soubermos para que serve, se pudermos ter de alguma forma uma noção de certa proximidade entre os nossos caminhos futuros, ou tivermos a noção precisa do seu fim.
A verdade é que nós perdemos imenso tempo da nossa vida a querer demonstrar aos outros que devem confiar em nós. Podemos utilizar argumentos intelectuais mas, se não houver outra forma de convencermos os outros, nunca mais conseguiremos os nossos objectivos.
Na realidade a maioria das pessoas que tiveram sucesso neste desiderato conseguiram-no porque os outros pelas circunstâncias históricas em que estavam mergulhados já estavam previamente à espera de confiar em alguém que correspondesse aos seus sentimentos mais profundos. Não precisaram de fazer grande esforço. O lugar estava à espera de alguém.
Por isso muitas pessoas convencem mais enquanto estão caladas do que quando se exprimem, porque não souberam exprimir aquilo que os outros pressuponham elas representarem. O problema é que nós não podemos estar calados, nem devemos adoptar o discurso que agrade aos outros. Em condições normais o nosso discurso tem que confiar em si mesmo para eventualmente os outros confiarem nele.

16 maio 2008

A vivência num clima de desconfiança

A prevalência da desconfiança nas relações humanas dá origem a que fixemos um axioma para o estado de confiança. Quando duas pessoas confiam mutuamente uma na outra, a confiança de cada uma não tem necessariamente a mesma origem, embora vivam no mesmo estado de confiança.
Daí que não deve constituir qualquer surpresa se a desconfiança surgir repentinamente entre dois velhos amigos. Também por isso é que a amizade custa a manter e nem sempre está despida de dúvidas e preconceitos. Como tudo na vida custa a criar, não é fácil de alimentar. É muito mais fácil de perder, de esmorecer, de se esvair.
O estado de confiança pode ser mais ou menos intenso, ser mais fácil ou difícil de alcançar, a sua sobrevivência ser mais ou menos questionada, mas depende sempre em última instância daqueles que o vivem. Mas quando uma amizade, uma qualquer ligação que pressuponha um depósito de confiança, se perde, não raro procuramos as razões de tal facto, sempre nos outros, raramente em nós.
A coisa funciona mal é porque na sua origem estão interesses conflituantes que não foi possível compatibilizar. Mas porquê se eventualmente até interesses contraditórios não darão origem ao fim inevitável duma relação? Sempre, em meios agrícolas e em sociedades menos complexas, se dirimiram conflitos de interesses de modo a não atingir as formas estabelecidas de relacionamento.
O que é novo na nossa sociedade, pela sua generalização em relação ao passado, em que só esporadicamente poderia acontecer, é a quebra da estabilidade de uma relação por via do surgimento de novos interesses. Isto impõe, em favor da saúde da relação, a sua refundação. O que pode também acarretar o seu fim, o que para muitos será sempre uma quebra de lealdade, mas que a sociedade vai aceitando com cada vez mais naturalidade.
Neste aspecto, nós estabelecemos sempre um limite até onde os nossos interesses podem ser postos em causa e negociados. Já não há interesse prático em ser irredutível. Mas quando há novos interesses que se interpunhem, eles farão sempre prevalecer a desigualdade social. Cada um parte de uma diferente base negocial.

15 maio 2008

A sabedoria, a relatividade e a confiança

Estamos habituados a tudo discutir sem que tenhamos conhecimentos suficientes para o fazer. No entanto achamos isso normal porque todas as pessoas são chamadas a opinar sobre todas as questões e ninguém gosta de passar por ignorante. Aliás, valendo em democracia o voto de um ignorante tanto como o voto de uma sábio, ou tido como tal, não poderia ser de outra maneira, todos têm o direito de discutir tudo.
Depois há um campo de análise pela objectividade em que as coisas se misturam muito de tal modo que entre opiniões e interesses não é fácil distinguir. No extremo podemos ter um sábio que age em determinado domínio pelo interesse mais mesquinho e um ignorante, até por não ter interesses específicos nessa área, que dá a mais sábia opinião.
Esta relatividade não nos pode levar a querermos ser ignorantes e a dizer que todas as opiniões são iguais, antes nos deve pôr alerta para sabermos o que está por trás da opinião de cada um. No entanto esta situação tem levado a um clima de suspeição que impõe restrições inaceitáveis à prática na actividade económica e cria desconfianças intoleráveis na vida social.
As chamadas figuras públicas, que se não podem furtar a uma certa devassa da sua vida privada e não privada, possivelmente incoerente com a do presente, já estão normalmente preparadas para isso e elas próprias dão ideia de uma permissividade que quase sempre não tem correspondência com a realidade. A devassidão é mais própria de pessoas que vivem em mundos de certo modo delimitados e com regras muito próprias.
Permanentemente estamos obrigados a pôr a questão se alguém está a falar a verdade, se não está a esconder as suas verdadeiras intenções, se tem o grau de honestidade que permita confiar nele, se acha ter o grau de impunidade que lhe permita dizer o que quer. Mas estamos ainda obrigados a não ferir susceptibilidades e não meter todos na mesma panela.
Mesmo que não queiramos, somos desconfiados, embora de modo diferente em relação a cada um. Isto impõe-nos que tenhamos a sensatez suficiente para saber a panela em que devemos meter cada pessoa que se nos depara. Quando ela não está em panela que nos agrade só temos que deixar passar. Cada qual, mesmo na Internet, só consegue uma vivência sã no mundo em que confia.

14 maio 2008

Humanistas sem carta e desumanistas encartados

Expectantes, todos nós aguardamos a explosão de ideias que os staffs dos candidatos à liderança do PSD estão a preparar para nos surpreender no dia 23. Para já andamos entre o pendor mais ou menos social-democrata, mais ou menos liberal, de cada candidato. Para já apenas uma candidata nos espantou. É que ela é humanista, nova designação que quer dar ao seu espírito caritativo, de repartidor dumas migalhas que sobrem ao capital.
No mesmo dia uns dirigentes de topo, que possivelmente deveriam estar presos, se todas as leis se cumprissem neste País, vieram barafustar contra o Ministro das Finanças porque na Comunidade se está a abordar uma forma de por cobro a esta rapinagem que está a ser feita nas empresas.
As empresas não podem ser sede de um poder absoluto, tem funções sociais a cumprir, só existem porque o Estado lhes garante a existência, porque impõe a elas, aos concorrentes, aos fornecedores, aos clientes, a toda a sociedade, regras que lhe permitem ter lucros. Os gestores não podem fazer destes lucros o que querem.
Infelizmente o capitalismo permite muita fuga de rendimentos, muito desvio de fundos da função que eles deviam desempenhar. Há emprego fictício, dado a familiares, a prostitutas, para já não falar da compra de influências, de subornos, de todas as formas de corrupção. O Estado é incapaz de controlar muitos destes actos, mas é evidente que deve pelo menos ocupar-se daquilo que é uma ostentação, um abuso, um roubo: Os salários principescos dos gestores.
A tributação fiscal será a única forma que o Estado terá para lidar com este problema e deve-a utilizar com o máximo vigor. Quando os gestores já têm as suas despesas correntes cobertas por toda a espécie de benfeitorias, levar vencimento multimilionários para casa é uma situação obscena, indecorosa, desumana.

13 maio 2008

Uma forma ignominiosa que não atinge só Ferreira Leite.

O PSD é o partido que mais facilmente recorre à ignomínia como forma de actuação política. Quando há dias Ferreira Leite disse que, como era evidente, não responderia à pergunta que lhe fizeram sobre o seu voto nas legislativas de 2005, saltaram a terreiro clamando haver sacrilégio.
Embora saibamos que houve pelo menos um destacado social-democrata que não votou em Santana Lopes, não nos custa acreditar que Ferreira Leite o fez e até teria considerado a pergunta ofensiva. No entanto os candidatos que se lhe opõe para atingir a liderança do PSD acharam que ela ao evitar ser clara na resposta mostrou que não votou em Santana.
Não vi a gravação do seu depoimento, a voz, o tom, a forma de falar que com certeza dariam uma ideia de estar a achar estranha a pergunta porque a resposta seria de tal forma óbvia. Dariam uma ideia se, caso constrangida a tomá-la, a sua atitude fosse naturalmente de repúdio, ou se, pelo contrário, seria incómoda ao ponto de lhe não responder frontalmente.
Acho abusivas as ilações tiradas por Santana Lopes de que mesmo o seu desmentido não é sincero. Tal só é possível porque Santana Lopes toma a candidata pelo seu referente. E como este o considerou como uma moeda falsa, decerto que ajudou a que ele não passasse, mesmo indicado pelo seu partido.
Estaria no seu pleníssimo direito, se eles fossem democratas e considerassem que quando se vota se deve ter em consideração o interesse do PAÍS. Mas assim eles não acharam e até acharam que ele é mentirosa e indigna de estar no seu meio e toca a requerer que ela se afasta desta disputa pela liderança.
Esta desconfiança em Manuela Ferreira Leite parece pois ser uma forma de manifestarem igual desconfiança em Cavaco Silva, que tanto desejavam arregimentado à cruzada ignominiosa que já iniciaram há muito, reveladora da sua baixeza, da falta de sólidos valores. Quem são eles para fazerem julgamentos de carácter?

12 maio 2008

O significado do baronato em política

O partido que mais transfere para o plano nacional a lógica local de fazer política é o PSD. Os seus membros, eles próprios, não rejeitam, e muitos até se acham engrandecidos, em ter um sistema assim, o baronato. Por isso aqueles que pensam ser possível alterar o sistema estão enganados, quando muito serão capazes de uma nova integração e alguma substituição.
No plano local quase todos bebem do mesmo, duma estranha noção de que fazer política é estar na política, não ser preciso grande actividade para merecer um elevado estatuto e uma audição quase obrigatória naqueles temas que mais interessam, como nomeações, carreiras, mordomias. A verdadeira política pode andar aos trambolhões que pouco interessa.
O PS também sofre dos mesmos defeitos, creio que em menor escala. Estar é tão só o suficiente para que seja “permitido” que se ponham em cheque orientações do partido em questões fulcrais inseridas em estratégias nacionais devidamente estudadas, acordadas, aceites.
Os barões locais permitem-se uma autonomia de actuação que os coloca muitas vezes em clara contradição com o que há de mais consensualizado. Veja-se a associação de municípios e aí está um domínio em que muitos barões não resistem a entrar ma chantagem mais reles, na vingança mais mesquinha, no egocentrismo mais pérfido.
Não se é barão por se estar há muito tempo num partido, por se ter uma grande influência, mas já se é por se ser arrogante, por não ter espírito negociador, por se não estar habituado a fazer cedências, por se atribuir despudoradamente a propriedade de um emblema. Estes barões, resquícios do ruralismo, têm que acabar.
Felizmente que a nível nacional o PS já vai tendo uma maneira mais urbana de fazer política.

11 maio 2008

Os políticos dos projectos voluntariosos

O pior que pode acontecer na actividade política é, por falta de quadros, se irem buscar toda a espécie de oportunistas para dar satisfação às várias exigências que o sistema político faz aos partidos sem que estes desempenhem o mínimo trabalho na preparação atempada de pessoal para esse efeito. O que é necessário é colmatar esta lacuna.
O normal é que os partidos se estejam marimbando para a criação de interesse pela política e também para o aproveitamento daquele interesse que desperta nas pessoas e que estas vão desenvolvendo sem qualquer acompanhamento, de forma egocêntrica, adornando-se com umas leituras, umas referências mais ou menos inócuas, só para dizer que se está devidamente actualizado.
Quando os partidos políticos vão buscar alguém ao campo dos independentes, ou quando se entregam a alguns recém inscritos, não raro são levados por gente que dos partidos só têm aquela noção utilitária de que é a única forma de se alcançarem a determinados patamares de poder. E são levados porque normalmente é o partido que é obrigado a dar apoio às ideais destes salvadores.
É alguém com um projecto, diz-se, voluntarioso quanto baste. Ninguém, mesmo tendo o valor de ter elaborado um bom projecto, pode ser deixado em roda livre para o pôr em prática. Até porque a realidade é quase sempre mais complexa, os poderes são mais vastos, as coisas mudam e é necessário repensar projectos e limites. Um partido não pode estar sujeito à obstinação de ninguém, seja um independente ou um seu membro.
Quando alguém substitui a política pela manipulação, quando alguém cria a adulação à sua volta em vez de convidar os seus correligionários a pensarem a política e a darem os seus contributos para ela, estamos num sistema pobre e é esta uma das razões da falta de credibilidade dos políticos. Os políticos não podem ser átomos de sabedoria auto-suficiente.

10 maio 2008

Os políticos de blague

Se há políticos cuja conta corrente com o partido e com o País apresenta um claro crédito a seu favor, há muitos mais que têm um largo débito que nunca será pago. E o que é mais escandaloso é que se escondem por vergonha ou então desavergonhados aparecem na praça pública a reclamar créditos que não possuem. São os políticos de blague.
A nossa revolução, ocorrida após décadas de forçada apatia política, mobilizou gente impreparada, gente ambiciosa, gente sem escrúpulos. Como quase tudo se tornou político, como era necessária confiança política para tudo, criou-se um clima de bajulação que fez com que os piores fossem muitas vezes os escolhidos, só por serem subservientes.
Uma democracia madura pressupõe que seja diminuto o pessoal político, aqueles que estão autorizados a agirem segundo critérios políticos, sendo que todos os outros tem que exercer a sua actividade segundo os regulamentos pré estabelecidos, com critérios o mais rígidos possível, de modo a que não seja dado cabimento às suas ideias pessoais, se as tiverem, e aos seus interesses, que normalmente têm.
Em Portugal ainda estamos cheios de reizinhos, pequenos ditadores que se apropriaram dum serviço público, duma autarquia, dum departamento. Os critérios políticos que presidiram à sua indigitação e nomeação ainda hoje inquinam as relações entre serviços e entre estes e o público. E é esta gente que quer que o sistema se mantenha, reivindicando ainda mais benesses, numa lógica de carreira política que não tem qualquer consistência.
Em Portugal precisamos de gente preparada para fazer política no governo e na oposição, que possa ser convocada para exercer cargos públicos mas não necessariamente. Além de haver lugar para os técnicos, os políticos têm de ser cada vez menos e de melhor qualidade, isto é, com uma intervenção intelectual que se não fique por simples “blagues” em conversas de tertúlia ou na blogosfera.

09 maio 2008

Os empecilhos são homens que tudo devem à política

Se verificarmos a conta corrente que muitos políticos têm com o partido e com o País chegamos à conclusão que na opinião que expressam estarão sempre em condições de beneficiar de créditos que não conseguem cobrar. Desgraçados, dão tudo ao País, ao seu partido, ao seu líder e nada recebem em troca, endividam-se e não arranjam modo de vida.
Ninguém pode pedir aos políticos que sejam beneméritos, não deve ser isso que está em causa, que fiquem prejudicados na sua vida. Se não gostarem, se não se sentirem disponíveis para trabalhar para a comunidade procurem outra vida, mas não nos chateiem. Um dia André Gonçalves Pereira disse que, sendo Ministro dos Estrangeiros de Balsemão não ganhava para os charutos, mas que o fazia por um amigo.
Como o País é feito de amigos e aquele amigo lhe pediu para servi-lo, aceita-se que indirectamente o faça. Também não são necessárias retóricas sobre a Pátria. O homem tinha forma de suportar o seu luxo porque ganhava menos de cem contos e cada remessa diária de havanos custava-lhe à volta de cinco contos nessa época. A verdade é que, se ainda tem créditos, já há muitos terá desistido de os quebrar.
Pelo contrário há outros que tudo devem à política, mas que quando atingem determinado estatuto começam a funcionar em roda livre. Isto é, não consideram que o que a política lhes deu e aquilo que a sociedade lhes pagou para chegarem aonde se encontram deve ser considerado a seu débito porque nunca lá teriam chegado sozinhos e nunca o conseguirão pagar.
Não se trata da pura contabilidade monetária que o partido comunista faz com quem o serve. Trata-se de partilhar com os que de alguma maneira colaboraram, contribuíram, apoiaram ou simplesmente pagaram as mordomias de que beneficiaram, o seu conhecimento, a sua ajuda ou, o que ás vezes não é menos importante, o seu afastamento da frente dos outros, quando se tornam apenas empecilhos de uma actividade política salutar.

08 maio 2008

A chantagem é a prostituição da política

Não sou contra o facto de os políticos terem uma conta corrente com o partido, com o País, com quem quer que achem importante ter. Mas que usem essa conta-corrente continuamente para dizerem dos créditos a seu favor que ainda não estão devidamente cobrados parece-me de uma imoralidade, de um desplante, de uma desfaçatez, de um ridículo pedante.
Ninguém, quando está convencido da justeza dos seus actos, gostará que os desvalorizem. O problema está na natureza dos créditos de que eventualmente podemos e na nossa perspectiva devemos ou não beneficiar. Se os créditos esperados são morais parece que estamos todos de acordo, mas o político tem que estar preparado para os não receber.
No entanto há políticos que estão de tal modo convencidos da sua justiça que se agarram mesmo em desespero não prescindindo de os cobrar. E aqui é que reside uma questão crucial. É que ninguém se dá ao trabalho de cobrar créditos morais. O que as pessoas defendem quase sistematicamente é a sua transformação em créditos materiais, seja através da manutenção num lugar, na progressão na carreira, em metal sonante.
Mas o problema maior está na chantagem que é feita, a que se quer dar muitas vezes um ar normal, e em que tudo se mistura, se admite trocar de género, desde que o resultado final seja favorável ao chantagista. E a chantagem mais fácil de fazer é a feita sobre os colegas de partido, que no geral apresentam as mesmas vulnerabilidades e se deixam mais levianamente “enganar”.
Claro que a população em geral também se deixa enganar. Senão a chantagem de concorrer de forma independente a uma Câmara Municipal não teria qualquer efeito, porque o que devia mas não espera ao chantagista é a marginalização. O chantagista é o prostituto da política.

07 maio 2008

Os pobrezinhos, a caridade e a falsidade

A Direita Nacional tem uma especial predilecção pelos pobrezinhos. São os pobres que lhe vão permitir ascender ao reino dos céus. Ajudar os pobres é uma tarefa tão meritória, tão meritória, como ajudar a retaguarda foi importante no tempo do movimento nacional feminino. Que então não se falava de pobreza. Éramos um País rico, senhor de um império colonial.
A lamechice nacional mete nojo. Lutem por um posto de trabalho, criem-no se puderem, dêem trabalho a quem precisa, mas não digam que resolvem as questões desta maneira asquerosa, manipuladora, que expõe toda a espécie de misérias, sejam materiais, sejam morais, perante a comunicação social e o País. Quem hoje se não sabe lamentar na televisão?
A caridade é uma das marcas da direita nacional. Para ela não se fale em solidariedade, em integração social, em igualdade no direito ao direito de ter uma dignidade idêntica, seja-se poderoso ou não. Mais do que uma situação, a pobreza é um ferrete que a direita gosta de espetar no corpo nacional. Quando está no poder farta-se de diferenciar a sociedade e de etiquetar as pessoas.
Então esta preocupação com as classes médias que se estarão a empobrecer é de ir às lágrimas. Não dizem que é por haver uma grande concentração do capital numa classe alta cada vez mais isolada do todo nacional. Não dizem que é porque as classes altas se diferenciam cada vez mais que a classe média contribui mais para a necessária solidariedade que, um pouco forçadamente é certo, pratica com as classes mais baixas.
Esta caridade ostentadora não é maneira de resolver as questões. Não há forma mais iníqua de praticar a caridade do que a caridade generalizada, à custa dos outros. A caridade é pessoal não é social. Ao menos sejam como o cónego Francisco Crespo que no D.N. de 22/04 afirmava com uma clareza meridiana: “Não podemos aceitar só pobrezinhos (num Asilo) senão não sobreviveríamos”. Estes mais necessitados, os pobres que se lixem.

06 maio 2008

A importância da Internet numa relação saudável com o universo

Os velhos têm sempre a ideia de que os jovens beneficiam de demasiadas facilidades. A maioria entende mesmo que foi criada no ambiente ideal, afora o problema da alimentação que não seria tão cuidada como hoje. A verdade é que o ambiente de uma grande maioria foi demasiado inóspito para aquilo que nós consideramos uma sensibilidade média.
O ambiente dito não apropriado dos jovens de hoje, por ser demasiado benévola com eles, não é criação de quem tenha experiência, porque se vê que então seria diferente, é antes a criação de um acaso, resultado de uma ausência de responsabilidade, produto da confluência de uma série de forças que se desenvolvem para dar solução a outros problemas e que os jovens aproveitam em seu favor.
Exemplo disto é a Internet, instrumento poderoso cujo objectivos são por de mais de elogiar, mas que tem uma utilização em muitos casos descabida. Por isso não pode deixar de se dizer, mesmo que com uma onda tão fraca, que era bom que se utilizasse a Internet para o cultivo e o culto do Belo.
Por mais inóspito que tenha sido o nosso ambiente jovem em termos de facilitar a criação de uma sensibilidade douta, estamos sempre a tempo de a cultivar, de nos prestarmos ao culto da beleza, única forma de nos relacionarmos de uma maneira saudável com o universo todo.
Se nos convencermos que o Belo nos pode surpreender, mas que nós também o podemos procurar, conseguiremos ser menos soturnos. A Internet pode desempenhar um papel de extrema importância neste domínio.

05 maio 2008

Da agricultura à sociedade industrial

Acabou o tempo da comida barata, é apresentado hoje como uma declaração inteligente. Se considerarmos este barato como o político, aquele que nos tem sido impingido desde que existe sociedade industrial, desde que as cidades cresceram sem controlo, desde que o consumismo foi elevado ao mais alto patamar da realização humana, está certo.
A primeira preocupação da sociedade industrial e dos políticos que a representam, sejam de direita ou de esquerda, desde que minimamente sensatos, tem sido a reprodução da força de trabalho, isto é, a garantia de que o povo trabalhador é bem alimentado para produzir e ter filhos que lhe dêem continuidade. O abastecimento das cidades sempre é a primeira função de qualquer governo.
Só quando a agricultura começou a produzir excedentes que pudessem ser conduzidos para as cidades é que nasceu a civilização urbana e com ela todo o progresso, mas também toda a avidez que caracteriza hoje o homem. O Oriente fértil, o Vale do Nilo, a revolução agrária da “enclosure” britânica, a introdução da batata, do milho de maçaroca e outras culturas americanas, a agro-indústria do frango de aviário, da pocilga, do estábulo deram origem a civilizações evoluídas.
Mas sempre houve avanços e recuos, progressos rápidos e desaparecimentos bruscos de civilizações. Sempre estas se fecharam dentro de si e acabaram assimiladas por outras mais atrasadas. O que hoje se impõe é que refreemos a nossa avidez para que se construa um mundo mais equilibrado em que nós não vivamos à custa de um parte do mundo que ainda tem na agricultura boa parte da sua actividade. Não queiramos que o barato do político seja a miséria de milhões.

04 maio 2008

De irracionalidade estamos plenamente cheios

A Humanidade parece encontrar-se num labirinto, tornado beco sem saída. Seguimos por um caminho e deparamos com um fim por efeito dos recursos limitados, do efeito de estufa, das coisas imprevistas. Então todos nos preocupamos em arrepiar caminho e seguir por nova via. Mas eis senão quando o mesmo problema com outra face se nos depara e nos vai retirando a esperança de prosseguir.
Por sorte algumas daquelas calamidades anunciadas estão posta definitivamente de lado. Que os medicamentos nos tornem cada vez mais dependentes parece ter sido um erro de análise que os factos vêm desmentindo continuamente. A esperança de vida aumenta, as condições em que se passa a velhice melhoram. Que os alimentos não iam chegar também parece não ser o caminho do apocalipse. O problema é agora e sempre a energia que nos ameaça esse domínio essencial.
Quer dizer que só há uma ameaça à Humanidade, ela própria, que nos prepara um fim bem menos digno. A ambição de todos os homens de esticarem os seus braços até ao infinito, de chegarem com as suas pernas ao insondável, de farejarem os odores do túmulo do universo, de olharem o esplendor das cores inimagináveis, de ouvirem o ribombar do nascimento das estrelas, de falarem com os seres voluptuosos das entranhas universais.
Ao homem não lhe chega estar, contemplar, sentir. Ao homem não lhe chega aquilo que a ambição dos outros já conseguiu, mas ir mais além. Ao homem não lhe chega ser racional, ambiciona que, quanto mais racional for, mais esplendorosas serão as suas construções que, para terem algum valor, terão que comportar dose suficiente de irracionalidade.
De irracionalidade estamos plenamente cheios. A irracionalidade de exigir aos governos, a todos os governos do mundo o máximo de progresso, o máximo gasto de energia e de condenarmos todos os malefícios que esta, aquela, aqueloutra e outra e mais outra e todas as energias directamente ou indirectamente farão ao universo.
Mas por incrível que pareça vemos mais depressa os efeitos indirectos do que os directos. A nossa esperança é que a crise alimentar, que dizem se avizinha, sirva para pensar no que está efectivamente mal e não só para a habitual lamechice nacional de querer virar todas as atenções para os pobres, com uma caridade de meia tigela. A pobreza de espírito está em todos e em especial nos ricos.

03 maio 2008

Falta o expoente maior do nosso individualismo

Em política cada qual julga estar a agir com uma racionalidade superior à do vizinho. Há políticos que gostam de obter vantagens à margem do jogo democrático, quando lhes parece que esse jogo lhes não é favorável, não é racional. Mas tudo tem limites e às vezes é melhor não esticar demasiado a corda porque o tropeção pode ser muito grande.
Daniel Campelo ter-se-á apercebido que era melhor abandonar o aliado de momento, Defensor Moura, e procurar integrar-se com o mínimo de percas neste novo percurso a fazer com os outros autarcas do Alto Minho. Não se terá rendido à democracia mas rendeu-se de certo a razões práticas que na política não são despiciendas.
Enfim a posição de Defensor Moura não tem agora qualquer suporte e de certo também os seus seguidores de Viana do Castelo já se vão apercebendo que sem haver cedências não haverá acordos e em consequência os milhões da Comunidade para este distrito que, antes de ser humilhado, se não tem apresentado com a dignidade devida.
Defensor Moura é tão só o expoente de um individualismo que tem feito que todos paguemos caro, com um atraso desmedido, a nossa incapacidade para criarmos projectos que nos unam, em que todos nos empenhemos, em que os esforços individuais criem sinergias que nos favoreçam a todos. Desta vez não temos desculpas pois quem nos humilha é um dos nossos.

02 maio 2008

Ainda não será possível ver para que lado corre a água?

Este correr de muita gente afim para a entrada de cena cria uma espectáculo triste, deprimente. Se houvesse diferenças acentuadas justificar-se-ia, mas em muitos casos não se consegue descortinar razão para tantos parecidos permanecerem em cena.
Se João Jardim quer avançar, mas só o faria se todos desistissem para ele ficar contra Ferreira Leite e depois contra Sócrates, e para já o não faz é compreensível que Santana Lopes se mantenha na corrida, mas poderia ajudar a incentivar os outros à desistência, tipo também eu desistirei se todos desistirem. Velhas amizades e cumplicidades justificariam.
Além de ficar de bem com o João, como sabe que há quem ponha liminarmente essa hipótese de lado, a sua candidatura estaria sempre garantida. Mas também não há dúvida que enfraqueceria muito a sua posição, colocar-se à priori como substituível por uma hipótese longínqua.
Não se está a ver é o papel que o João pretende ocupar. Porque é que sentiu a necessidade de fazer mais esta cena de colocar pela segunda vez os seus rivais perante a hipótese de desistência a seu favor. Não estaria ele à espera que, depois do primeiro momento de verdade no Conselho Nacional do PSD, Santana Lopes não avançasse?
Segundo este diz o João teria desistido expressamente de se candidatar. Haveria erro de interpretação, admita-se. Mas porque esta persistência em remeter uma decisão final para o último dia do prazo regimental de candidatura?
Os momentos de verdade, em que se tomam decisões irreversíveis, raramente coincidem com essas datas de calendário. Mas a verdade é que os prazos existem para que as pessoas tenham tempo para ver para que lado corre a água, e o João ainda não viu. Nós ainda não vimos.

01 maio 2008

A última oportunidade do João

Quem lhe podia dar uma oportunidade parece não estar disposto a fazê-lo. Seria útil ouvir da boca de João Jardim as propostas para a reestruturação do Estado que existe. Afinal que Estado quer, que funções lhe atribuir, que funções entregar à iniciativa individual. Nas actuais circunstâncias a sua voz confunde-se com a de todos os contestatários, como sempre tem sucedido aliás, e isso não ajuda até quem genuinamente o quer ajudar.
Mas acima de tudo penso que no PSD ninguém o quer ajudar. Todos têm vergonha dele. Querem-no afastado, lá longe nas ilhas, sem dizer as suas tradicionais baboseiras aos ouvidos das pessoas mais sensíveis. Também acho que só João Jardim se não terá apercebido disso há muitos anos. Aliás ele parece que sempre quis que lhe pagassem para não falar muito.
Muitos nunca chegam a viver o seu momento de verdade. Talvez porque hoje a esperança de vida é maior, porque os acontecimentos ocorrem a uma velocidade nunca vista, já muitos podem protelar até mais tarde esse momento. Mas sinceramente não terá corrido bem aos que têm feito isso. Expuseram-se quando já não tinham nada a mostrar de novo.
O momento de verdade vai chegar para muitos políticos do PSD. Muitos que já tiveram apoio ver-se-ão abandonados. Não podemos viver estas situações como fonte de qualquer prazer. Temos que as ver como uma necessidade de clarificação. E quem, abandonado, quiser algum dia voltar a disputar uma nova oportunidade deve pensar se não está a prejudicar o País.

Aqui pode vir a falar-se de tudo. Renegam-se trivialidades, mas tudo depende da abordagem. Que se não repise o que está por de mais mastigado pelo pensamento redondo dominante. Que se abram perspectivas é o desejo. Que se sustentem pensamentos inovadores. Em Ponte de Lima, como em todo o universo humano, nada nos pode ser estranho.

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"Big Man" 1998 (1,83 de altura) - Obra de Mueck

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